Não tem Whatsapp? GloboNews submete Miriam Leitão a ditado para rebater Bolsonaro
Durante a sabatina a que foi submetido na noite desta sexta-feira, 3, a um grupo de jornalistas da GloboNews, o candidato à presidência Jair Bolsonaro (PSL) fez questão de lembrar que Roberto Marinho, fundador da Globo, apoiou o golpe de 1964 e ratificou essa iniciativa com editorial publicado no jornal “O Globo”. “Ele não era democrático?”, provocou Bolsonaro, que é militar de formação e defende as ações do período da ditadura.
A direção do grupo Globo reagiu bem e com rapidez ao refutar Bolsonaro, lembrando que em 2013, o grupo reconheceu o erro pelo apoio ao golpe, também por meio de um editorial publicado pelo jornal “O Globo” e repetido por William Bonner no “Jornal Nacional”. Pena que a realização dessa reação tenha sido tão desastrosa. Uma nota preparada às pressas foi ditada à âncora do programa, Miriam Leitão, por meio do ponto eletrônico, como se um fantasma falasse com a jornalista, que ia repetindo cada palavra, sem chance de dar ao texto a devida ênfase e pontuação.
Talvez outros apresentadores, com mais traquejo para improvisar, teriam deixado claro ao espectador que estavam seguindo orientações do ponto eletrônico. Miriam deixou que cada um concluísse isso por si, o que tornou a cena mais constrangedora. Não é culpa dela, naturalmente, mas da inexperiência com esse tipo de situação.
Que falta faz um aplicativo de mensagem de texto via celular, coisa mais que corriqueira hoje em dia, num momento como aquele. Podem achar que pega mal segurar nas mãos um celular enquanto se apresenta um programa de TV com toda a pompa e circunstância que uma sabatina como aquela exige, mas há como camuflar o aparelho na poltrona ou até deixá-lo a vista na mesinha ao lado. É menos deselegante do que ter de repetir pausadamente, aos soquinhos, um recado via ponto eletrônico. Nesse momento, o ponto serviria apenas para avisá-la que havia um recado a ser lido no ar disponível no celular.
Ricardo Boechat tem desafiado essa premissa em plena bancada do “Jornal da Band”, às vezes para ler até mensagem de telespectador. Quando se tem jogo de cintura para improvisar, como é o caso do jornalista da Band, essa é uma ação que ganha absoluta naturalidade, o que só gera mais confiança do público naquela figura.
É preciso dizer, no entanto, que são os próprios diretores por trás desses pontos eletrônicos, principalmente na área do Jornalismo, que menos incentivam o treino de seus âncoras para a improvisação. As chefias são, em geral, ciosas do que vai ser dito na frente das câmeras, o que em parte se justifica pela preservação da importância que a linha editorial representa para a empresa. Mas esse controle também denota falta de confiança em quem está à frente do microfone.
De todo modo, complementar o ponto eletrônico com um breve alcance ao Whatsapp, se necessário, não custa nada nem põe em risco as rédeas dos chefes.
Fica a dica.
Eis aqui a íntegra da nota lida por Miriam Leitão, após ter dado “Boa Noite” e encerrado o programa, para depois, muito sem jeito, pedir que esperassem um pouco mais, sem explicitar que alguém lhe enviava um recado ao pé do ouvido. Visivelmente feito às pressas e lido sem pontuação adequada (até em função de ter sido ditado palavra por palavra, como já foi dito aqui), o texto contém alguns trechos confusos.
“Em relação às declarações do candidato Jair Bolsonaro sobre ‘O Globo’ em 1964, o Grupo Globo emitiu a seguinte nota: ‘O candidato Jair Bolsonaro disse há pouco que Roberto Marinho, em editorial de 1964, afirmou que participava do que chamava de Revolução de 64, identificado com os anseios nacionais de preservação das instituições democráticas. É fato. Como todos os grandes jornais da época, com exceção da ‘Última Hora’, ‘O Globo’ apoiou editorialmente o golpe, com o objetivo reiterado de Roberto Marinho 20 anos depois. O candidato Bolsonaro esqueceu-se porém que em 30 de agosto de 2013, ‘O Globo’ publicou um editorial em que reconheceu que o apoio ao golpe de 64 foi um erro. Nele, o jornal disse não ter dúvidas de que o apoio pareceu aos que dirigiam o jornal na época e viveram aquele momento a atitude certa, visando ao bem do país, e finaliza com essas palavras, o editorial: ‘à luz da História, contudo, não há por que não reconhecer hoje, explicitamente, que o apoio foi um erro, assim como equivocadas foram outras decisões editoriais no período que decorreram desse desacerto original. A democracia é um valor absoluto e corre risco. E só pode ser salva por si mesma.”
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