Wagner Montes sobreviveu ao sensacionalismo noticioso da TV
Artista, advogado, jornalista e político, Wagner Montes encerra sua trajetória com o êxito de quem sobreviveu ao sensacionalismo noticioso da TV, uma receita sempre acusada de afastar publicidade, mas jamais sepultada na história da televisão no Brasil. No fundo, e nem tão no fundo assim, os anunciantes não resistem a uma comunicação de alta popularidade, e esse é o caso dos programas que fizeram a fama do fluminense de Duque de Caxias, morto neste sábado, aos 64 anos.
Montes representava como poucos a figura do apresentador indignado com o crime, capaz de contagiar a ira do telespectador e despertar na plateia a tentação de julgar e punir os pecados alheios. Além de nos emprestar a falsa sensação de poder, brincar de juiz ajuda a expiar a própria culpa sobre as falhas de cada um.
Daí o papel quase irresistível desse sujeito que chegou a atuar em alguns filmes no início de carreira (“A Morte Transparente”, em 1978, e “A Pantera Nua”, em 79). Chegou a ser cantor, mas, para a sorte dos nossos ouvidos, logo caiu nas graças de Silvio Santos e passou a frequentar os júris de seus programas.
A mesma vocação que o colocou diante das câmeras fez dele um candidato quase sempre muito bem votado em uma carreira iniciada em 1990, como deputado estadual pelo PTB. Mas o primeiro mandato veio como suplente, ainda sem votos suficientes para o cargo.
Passou pelo PDT, comprou muita briga partidária na Assembleia do Rio, que chegou a presidir, esteve no PSD e morreu tendo sido reeleito pelo PRB, sempre na esfera estadual, onde podia conciliar sua tarefa política com o prazer de estar na TV.
No SBT, esteve no “Povo na TV”, precursor do lendário “Aqui Agora”, do qual foi um dos astros. Foi o noticiário mais freak já exibido pela TV, com Gil Gomes, Jacinto Figueira Júnior (o “Homem do Sapato Branco”) e até o hoje apresentador da Globo, César Tralli, que fugia desse estilo, evidentemente, mas traz daquele período um grande aprendizado sobre carisma e comunicação popular na tela.
Montes está presente naquele personagem que André Mattos interpreta no “Tropa de Elite 2”, quando deixa as autoridades do Rio de joelhos em razão do discurso que seduz a massa contra o tráfico organizado. Também há Wagner Montes no apresentador fictício vivido por Stepan Nercessian na série “Um Contra Todos”, grande produção da Conspiração para a FOX, indicada ao Emmy Internacional. Ao lado de profissionais como Marcelo Rezende e José Luiz Datena, Montes ajudou a inspirar e moldar os herdeiros daquela geração, como Luiz Bacci e Reinaldo Gottino.
Trabalhou nas rádios Record e América, em São Paulo, e na Manchete, no Rio. Em junho de 1997 foi contratado pela Rede CNT, onde comandou os programas “190 Urgente”, “Na Boca do Povo” se “Em Cima do Fato”. Teve também lá o seu show, o “Programa Wagner Montes”, e lançou na CNT o “Novos Talentos”, para quem estava começando.
Estava na Record desde 2003, tendo passado pelo “Verdade do Povo”, “Cidade Alerta Rio”, “RJ no Ar” e “Balanço Geral”, precursor da marca nacional que hoje engorda os índices de audiência da emissora com versões regionais por todo o país.
A falta da perna direita, amputada após um acidente com triciclo, no Rio, em 1981, e o casamento com a atriz e apresentadora Sônia Lima conspiravam a favor de uma imagem forte moldada em torno dele.
A morte veio após internação por tratamento de uma infecção urinária. Nos últimos anos, o excesso de peso o levou a andar até de cadeira de rodas, por um período, em 2017. Em novembro passado, sofreu um infarto e parecia estar se recuperando bem do estrago.
Montes deixa dois filhos: Wagner Montes, também político, filho da ex-miss Cátia Pedrosa, e Diego Montez, ator, de seu casamento com Sônia Lima.