Globo quer evitar riscos em novela das nove
Produto de maior peso no saldo de audiência da Globo, a novela das nove é o produto em que a emissora menos arrisca testar inovações.
“A Dona do Pedaço”, de Walcyr Carrasco, próximo folhetim do horário, só endossa a falta de disposição para apostas e experimentações. A trama tem um princípio de “Romeu e Julieta”, clássico dos clássicos, com Marcos Palmeira e Juliana Paes – ela pensa que ele, alvejado por dois tiros, morreu, e foge, deixando para trás a informação de que ela também estaria morta.
Mais adiante, na luta pela sobrevivência, a mocinha se tornará uma magnata da confeitaria: de bolo em bolo, fará fortuna, mas a filha, Ágata Moreira, assim como Fátima Acioli (Glória Pires em “Vale Tudo”), terá vergonha da história da mãe.
Os pontos de partida da trama são altamente avalizados pelo público. São receitas que já provaram bom efeito em mais de uma ocasião.
Na novela atual, “O Sétimo Guardião”, o mínimo sinal de rejeição do grande público a ingredientes de terror fez com que esse fator, um dos pilares prometidos para a produção, se recolhesse para dentro do armário. Nesses capítulos finais, e só agora, voltamos a encontrar uma pitada de paranormalidade explícita nos poderes da ruiva Marina Ruy Barbosa.
A chamada de “O Sétimo Guardião” apostava na sofisticação do gato preto e sua performance na pós-produção de imagens.
Naturalmente, não foram os poderes de Luz nem os efeitos do felino que desanimaram a plateia, no caso do “Guardião”, mas quando a audiência patina, muitas ideias são sacrificadas, sem a devida chance de serem desenvolvidas.
A chamada de “A Dona do Pedaço”, recém-lançada, parece reality de confeitaria do “Cake Boss” de Buddy Valastro, com frases de autoajuda muito convenientes para esses tempos tão difíceis. O anúncio busca o caminho mais fácil para atrair a plateia, sem vergoha
Paralelo a tudo isso, temos uma novela das seis belíssima, que todo mundo se perguntou por que não foi alçada à vitrine de maior visibilidade da casa: por que, afinal, “Órfãos da Terra” não entrou às 21h? Embora esteja bem baseado nos alicerces do folhetim, o enredo seria um pouco “pesado” para a pasmaceira das nove da noite, e houve quem não ousasse arriscar.
O conjunto da obra aqui desenrolado indica que a emissora não está disposta a colocar em xeque sua vitrine principal. Cada tentativa de trazer novos ares ao folhetim de intervalos comerciais mais caros do país, no segmento do entretenimento, é sufocada pela certeza de que a novela das nove não foi feita para experimentações. O que for dando certo pode até seguir em frente, mas, na dúvida, a preferência será sempre pela receita mais fácil, avalizada, mastigada para a compreensão do público.
Manuela Dias, a autora a seguir, representa um sopro de esperança por alguma inovação, em razão do bom trabalho prestado à produção de séries na emissora (“Ligações Perigosas” e “Justiça”). Mas é preciso que não se ceda por completo ao mínimo sinal de rejeição de um pequeno grupo de discussão, nem sempre representativo nesse contexto atual que valoriza o entretenimento por segmentos de público tão diversos e polarizados.