Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Camila e Domingos tentaram evitar assédio

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O motorista que levava Camila Pitanga e Domingos Montagner ao hotel, após as gravações de ‘Velho Chico’, na tarde da fatídica quinta-feira em que ele se afogou no Rio São Francisco, não era da região. E chegou a alertar os dois sobre as dúvidas a respeito do local onde eles pararam para nadar: “será que não é melhor a gente perguntar pra alguém?” Os dois atores então se entreolharam e acharam que não. Não pretendiam chamar a atenção para suas ilustres presenças no local, a fim de evitar um assédio público, como invariavelmente ocorre com astros da TV, ainda mais em regiões distantes do eixo Rio-São Paulo.

A revelação fez parte da entrevista que a atriz deu a Sônia Bridi na tarde deste domingo, 18, e exibida pelo ‘Fantástico’. Diante de toda a comoção do relato, é um ponto que até tem passado despercebido na repercussão em torno de seu depoimento, mas que revela um pouco da inconveniência que a fama pode causar.

Abaixo, você encontra a íntegra da entrevista, que pode ser vista por este link:
http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2016/09/camila-pitanga-fala-sobre-morte-de-domingos-montagner-veja-entrevista.html

“A gente já tinha meio que apalavrado de encontrar com o Gabriel, pra tomar esse banho de rio, o Gabriel estava indo gravar, a gente falou com a Lucy Alves, ela tava já partindo, indo embora, eu não sabia, mas acabou que pora caso, só nós dois podíamos ir naquela hora. E quando a gente tava indo pro hotel, a gente viu que tinha essa praia, que era muito claro, tinha dois quiosques, parecia um lugar frequentado. A gente nem ia pra lá, a gente ia pra outro lugar e a gente acabou achando que era mais simples ir ali., O motorista não era da região, mas ele em algum momento teve uma intuição, porque ele falou “será que a gente não pergunta?” E a gente, eu e o Domingos a gente se olhou, e a gente falou: ‘acho que não, porque tá tudo tão… Tá vazio porque é dia de semana, então…’ E a gente não queria chamar atenção porque sempre, com ator, tem isso. Vai num posto de gasolina tomar uma água, vira um evento, vira uma coisa maior, a gente queria ter uma certa objetividade.’ E a gente olhou pra direita, tinha uma água meio parada, meio lodo, não era uma coisa convidativa. Aí tinha umas pedras, aí o Domingos subiu nessas pedras e falou: ‘Cá, aqui tá lindo, aqui tá ótimo, vamos mergulhar aqui. Isso já nos afastava do litoral, da faixa de areia, onde dava pé. Quando a gente mergulhou, o Domingos mergulhou logo de cabeça e eu, mais cabrera, sou mais medrosa com essa coisa de saltar, eu fui devagarinho. Eu notei que tinha uma pedra, com uma marolinha batendo. Aí, tem um detalhe: a gente tava nadando a favor de uma correnteza muito perene, muito suave, que a gente não percebeu. Então, a gente mergulhou já num lugar que tinha profundidade, mas o olhar, pra qualquer pessoa, era de tudo parado. Tem lá na frente, lá onde o rio corre, você não pode chegar. A gente não tava nessa região.”

Sônia Bridi: Você sentiu uma mudança na corrente?

“Não! E qual era o meu medo? O que nos acendeu? ‘A gente pode se machucar na pedra’. Não foi ali pânico. Foi ‘vamos voltar’. E ele, ‘claro, vamos voltar’. E fomos nadando. O Domingos estava mais na minha frente, eu estava um pouco mais próxima da faixa de areia, e a gente perdia sempre. por mais que ela fosse suave, a gente nadava, nadava, nadava, e ficava. Mas isso não se estendeu por muito tempo.

Sônia: Não deu tempo de ter uma exaustão?

“Não. Não deu tempo de ter uma exaustão. Na verdade, quando eu percebi que eu não conseguia vencer essa correnteza, que era muito suave, mesmo, aí eu me desesperei, aí eu respirei errado, vi que eu estava respirando errado. Aí eu falei, não, vamos parar, falei comigo mesma. Tudo isso que eu tô falando parece que tem uma duração enorme, mas são átimos de segundo, eu falei ‘vou ter que me organizar’. Mas eu não tava tendo noção mesmo do que estava acontecendo. Nisso, eu notei, na minha lateral, que tinham pedras, a três ou quatro metros. Eu falei, ‘vamos pra lá, vamos segurar na pedra, porque a gente não tá conseguindo voltar. E a gente tá falando de uma pedra que não era um paredão. Então, quando eu cheguei aqui, a correnteza já não tinha mais nenhuma força, a água continuava e seguia. Aí eu falei ‘ah, tá tudo bem’. Ali, de fato eu me acalmei, ‘tá tudo certo, vem Domingos, aqui tá tudo certo’. E eu tava notando que o Domingos, ele não nadava, e tava assustado. Então eu falei: ‘ele tá assustado, eu vou ajudar’. Não tinha noção do que estava acontecendo. Não sou heroína, nada disso. Pra mim, tava tudo tranquilo, então, naturalmente, se foi tão fácil eu chegar até lá, é fácil voltar e ajudar meu amigo que tá com medo, então, saí e fui ajudar meu amigo. Peguei no antebraço dele, ‘calma, tá tudo bem, você tá vendo?’ E ele não vinha. Eu soltei o braço dele, voltei pra pedra, pra mostrar pra ele que tava tudo bem. Eu falei ‘Domingos, eu tô te dizendo, aqui tá tranquilo, vem’. Ele não saia do lugar e não falava nada. Foi muito estranho porque pra mim, o natural seria fazer isso (gesticula braçadas), com braço, ele aparentava estar paralisado. Então, eu voltei de novo, peguei de novo no braço dele, fiquei puxando, ele não saía do lugar e dizia ‘Cá, não tô conseguindo!’. Aí, de novo voltei pra pedra, e disse ‘então boia, boia’. Eu queria que ele se acalmasse, entendi ‘ele tá nervoso, tá respirando errado’, então boia, boia! E comecei a gritar socorro, foi quando ele submergiu pela primeira vez. Ele dizia ‘eu não tô conseguindo’, engoliu uma água e eu falava ‘calma, calma!’ e comecei a gritar pedindo socorro, pedindo socorro,

Sônia: Quantas vezes você viu ele subindo e descendo?

“Foram só duas vezes. Quando ele submergiu e foi a última vez que ele submergiu, aí eu entendi o problema que a gente estava vivendo. Quando ele submergiu eu entendi que não podia ir lá porque tinha alguma coisa que era maior do que aquilo que eu estava imaginando, não era ele assustado, eu não sabia o que era. Era uma coisa que me dizia ‘eu vou’ e alguma coisa dizia ‘não vai’. Pausa. Comecei a gritar, me arranhava, me batia, e não tinha ninguém. Tinham dois barcos naquela lateral e não tinha ninguém. Eu gritava ‘é grave, é grave!’, tem alguém ali dentro da água, e eu sabia que eu não podia ir. Eu acho, Sônia, que provavelmente, devia ter sumidouros, alguma coisa devia estar segurando a perna dele, e ele, (pausa) lindo que é, generoso que é, não dividiu a real comigo.

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Sônia: Não passou pela sua cabeça que se você tivesse puxado ele pelo braço você poderia ter ido junto?

Quando ele submergiu, sim. Querer salvar meu amigo, e vi que não podia, e você ver que não pode, que não dá, porque senão você vai, pensei na minha filha. Nesse átimo de segundo parece que você dá a volta na Terra, tudo acontece. E ele sumiu.

Sônia: Você acha que ele tinha noção de que seria perigoso pra você se ele tentasse chegar?

Acho. Em nenhum momento ele me pegou, ele me agarrou, ele tava tentando, na verdade, se segurar, ele me salvou, eu acho que ele sabia que estava acontecendo e ele me deu a oportunidade de viver, me deu essa chance.

Sônia: É uma coisa muito muito generosa.

Muito generosa. muito generosa. Ele só dizia: ‘não tô conseguindo, não tô conseguindo’. E eu vi o último olhar dele. Ele não tava desesperado, ele não queria ir, tinha muita tristeza, ele tava cheio de vida, cheio de projetos, amado, uma família linda, que eu pude conhecer, e foram extremamente generosos comigo, que me acolheram, porque é muito duro relatar isso pra própria família, é muito duro ser testemunha disso.

Sônia: Você renasceu, você acha que é uma segunda chance?

É uma segunda chance, é uma segunda chance de estar com meus amigos, de estar com a minha filha, é uma segunda chance e eu vou honrar isso.
Ele falava muito dos filhos, sempre falou muito da esposa, tava feliz que ia fazer uma viagem pra Cuba, Eu entrei e vi a casa dele, os filhos na varanda, Luciana estava nervosa, mas depois foi assentando, e ela, de uma firmeza e uma força descomunal, queria muito entender o que tinha acontecido, relatei pra ela, depois relatei pra um grupo de amigos.
Quero agradecer, primeiro a minha família, ao meu amor, que ficou do meu lado o tempo inteiro, isso me fortaleceu bastante.

Sônia: Você vai volta a gravar a novela?

Vou, vamos todos, e a gente tá fazendo uma homenagem a ele, ele vai estar presente. Quando a gente acabou a gravação, a gente andava os três juntos, não sei se foi o Gabriel que falou ou se foi o Domingos que falou, ‘nossa, isso aqui podia ser o fim da novela, a gente podia ter uma letra cada um: F, I, M e se virar, ‘FIM’.

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Cristina Padiglione

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