Nazaré volta e promete mobilizar todas as atenções
Nazaré Tedesco chega sem pedir licença, como convém à personagem magistralmente vivida por Renata Sorrah em “Senhora do Destino”. Vilã que se tornou viral antes mesmo de as redes sociais vingarem, em 2003, a megera está de volta no “Vale a Pena Ver de Novo”, duelando com Susana Vieira, a Maria do Carmo, a partir das 16h30. A Globo vai emendar o final de “Cheias de Charme” com a estreia de sua substituta, fórmula que tem se tornado imbatível para conquistar a plateia, mesmo quando a novela a seguir é o título de maior audiência da TV do milênio. Agora revisitada no “Vale a Pena”, a trama de Aguinaldo Silva terá sua vez nas redes sociais, onde Nazaré, mesmo sem ser contemporânea do Twitter, tem até um perfil falso, dada a diversão que essa voz do mal gera ao comentar sobre os mais diversos assuntos. Agora, poderemos falar da verdadeira e exorcizar nossos impulsos ruins por meio dela, amém.
“Senhora do Destino” foi ao ar em 2004 e somou média de 50 pontos de audiência, patamar que as novelas do horário, nos últimos quatro anos, não alcançam sequer em seus últimos capítulos. Ainda que se considere o fato de 1 ponto de audiência, hoje, representar mais domicílios do que há 14 anos, a plateia é de fato menor e a fatia que cabe à Globo no bolo de TVs ligadas, em termos porcentuais, emagreceu significativamente. Mas, mesmo dentro daquele contexto em que as novelas das 9 arrebatavam mais da metade do País, “Senhora do Destino” foi um acontecimento de audiência estrondoso, visto que os folhetins do horário já vinham perdendo rebanho. Olhando em retrospectiva, a Globo não chegava à média de 50 pontos desde “O Rei do Gado”, de oito anos antes de “Senhora”. Tudo isso nos dá a certeza de que Nazaré e Maria do Carmo, com apoio do “Felomenal” Giovani Improta (e que falta faz Zé Wilker), conduzidos pela rica imaginação de Aguinaldo, fizeram história.
Nordestina, a vítima da loura má, mulher que teve sua caçula (Lindalva, ainda bebê, depois vivida por Carolina Dieckmann) raptada pela outra em um dia de confusão no Rio, em meio à repressão militar da ditadura, Passeata dos Cem Mil e tal, também se torna uma figura forte, como convém a um bom enredo: sem conflito, não há história que se sustente, e uma figura do mal não teria relevância diante de uma boazinha tolinha. Quando fraqueja, Do Carmo reconhece o erro e logo avança o passo. Não é mocinha chata, ao contrário, e isso faz da vilã uma peça ainda mais interessante. Mas há um fator extra que foge à receita clássica do mal X bem: Nazaré é sem noção. Vaidosa, deixa rastros, é atrapalhada. Seu hábito em empurrar pessoas da escadaria de casa e causar “acidentes” que levavam à morte virou piada, mas o telespectador comprava a história contada por Aguinaldo, autor que tanto já havia feito pelo realismo fantástico e em “Senhora do Destino” quis partir para o realismo, mas tendo aval para abusar da realidade – é bem provável que o passado do autor, hábil em criar narrativas fantásticas, leve o público a aceitar tudo o que ele inventa (até quando se vê diante da necessidade de trocar a atriz de um papel importante no meio do folhetim, como aconteceu com Drica Moraes em “Império”, substituída por Marjorie Estiano).
Quando foi receber o prêmio de melhor atriz de TV pela APCA (Associação Paulista dos Críticos de Artes), Renata Sorrah deu uma leve tropeçada em um dos cinco degraus que a conduziram ao palco do Teatro Municipal de São Paulo, gerando risos na plateia. Era a referência serial killer de Nazaré dando seu empurãozinho.
Um adendo: como o sequestro de Lindalva acontece pouco mais de 20 anos antes de a história se desenrolar, Nazaré é vivida, numa breve primeira fase, por Adriana Esteves. Dizem que foi ali que nasceu Carminha, outra vilã que cativaria o público sete anos depois, em “Avenida Brasil”, de João Emanuel Carneiro.