Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

10 pontos cruciais na briga entre Record, SBT e RedeTV! contra a TV paga

Rodrigo Faro, Luciana Gimenez e Ratinho, em nome da Simba, que une Record, RedeTV! e SBT

Qual o poder de barganha de SBT, Record e RedeTV! para ameaçar as operadoras de TV paga a não mais liberarem seus sinais gratuitamente, a partir do dia 29, quando o sinal analógico será desligado em São Paulo, maior mercado de TV do País? Por que a indústria da TV paga passaria a pagar a essas emissoras um custo por assinante, se o mesmo assinante poderia assistir a esses canais de graça? Vamos aos pontos:

 

  1. Os canais em questão, Record, SBT e RedeTV!, uniram-se numa empresa, a Simba, aprovada pelo Cade, que tem, como primeira ação, a reivindicação por uma remuneração da indústria da TV paga para carregar esses canais em seus pacotes. Afinal, mesmo entre quem paga para ver TV, a maior fatia de audiência cabe aos canais abertos. A Globo, sozinha, ainda tem mais audiência que todos os canais pagos juntos (embora essa diferença seja cada vez menor). E juntas, RedeTV, Record e SBT também representam um pedaço considerável do bolo. Logo, seria muito justo que cada um tivesse seu centavo por assinante que paga para ver TV.
  2. Por que esses canais abertos revindicam isso neste momento? Porque as operadoras de TV paga, até aqui obrigadas a carregar os sinais das TVs abertas, deixam de ter tal obrigação a partir da chegada do sinal digital. Então, essa é a hora de negociar, certo? Não é bem assim. Muita gente paga para ver TV aberta porque o sinal que chega às suas casas é ruim. Acontece que a própria TV paga corre o risco de sofrer uma grande perda de assinantes neste momento, justamente porque isso não será mais necessário, ou assim dizem. O sinal digital tem poder de alcance e definição que o analógico não tem. Portanto, em tese, o número de assinantes que pagam pelo pacote mais básico, aquele feito só de canais abertos, deve cair.
  3. Os canais em questão alegam que a Globo recebe seu centavo por cabeça de assinante, mas consta que isso, de alguma forma, tem a ver com os canais Globosat, investidores da indústria de TV paga desde o tempo das vacas magras no setor. Em menor escala, isso se aplica também no caso da Band, que tem canais exclusivos na esfera paga, e não vala para Record, SBT e RedeTV!, que nunca tiveram sintonias nesse segmento. Esse é outro dilema agora jogado à mesa nas negociações com a TV paga.
  4. Quando digo centavo, é bom explicar, estou usando o menor valor possível da moeda como algo figurativo para dizer que os canais dos pacotes básicos (que excluem HBO, Telecine e ESPN, por exemplo) recebem uma quantia modesta por assinante. Mas, considerando que a Simba, que une os três canais, receba apenas 1 real por assinante, teríamos aí uma conta de R$ 18,6 milhões. A indústria da TV paga, que perdeu mais de 300 mil assinantes no ano passado e 105 mil só em janeiro deste ano, e deve perder boa parte dos pagantes dos pacotes de canais abertos (como dissemos no item 2), estaria disposta a arcar com essa conta?
  5. Na briga com a indústria da TV paga, RedeTV!, Record e SBT já colocam seus artistas e pastores na tela para fazer um apelo ao telespectador assinante: que ele deixe de pagar a uma indústria que não valoriza a programação dessas emissoras. Chantagem por chantagem, a TV paga está pronta para responder que não acha justo repassar essa conta ao assinante, mesmo porque ele tem a opção de ver esses canais de graça.
  6. Na difícil negociação com a Sky, há pouco mais de um mês, a FOX fez algo parecido: pediu que seus telespectadores mudassem de operadora. Ora, a situação para a Sky era muito mais complexa do que o quadro atual o é para o setor de TV por assinatura. O assinante da Sky não teria mais onde ver “The Walking Dead” ou os novos episódios dos “Simpsons” e talvez mudasse mesmo de operadora. Mas, se eu gosto de ver o Silvio Santos, a Luciana Gimenez ou o Fábio Porchat, posso muito bem sair da minha NET e sintonizar a TV pelo conversor digital (que eu não tenho, mas posso adquirir por um preço bem inferior ao custo de uma única mensalidade de TV paga). Eu vou deixar de ver GNT, FOX, GloboNews, ESPN, Viva, Megapix, Warner, Sony, History, Cartoon ou Nickelodeon porque o Silvio Santos não está no pacote? Não. Qual a chance de eu sair da NET para ver o Silvio e me esquecer de voltar para o decoder da NET depois do fim do Silvio Santos, do Fábio Porchat ou da Luciana Gimenez, e embarcar na boa programação de novelas mexicanas em reprise ou na pregação da Igreja Universal? Zero. Eu posso muito bem trafegar entre a NET e o sinal digital aberto, de acordo com as minhas preferências. “Ah”, argumentam os canais abertos, “mas a nossa audiência não mais será contabilizada na soma geral da TV paga”. Verdade, mas isso certamente já vai acontecer, repetindo, em função do sinal digital que vai melhorar a transmissão para muita gente, passando a ser um custo a menos no apertado orçamento doméstico atual.
  7. Para ter a empresa aprovada pelo Cade, a Simba se comprometeu em produzir conteúdo inédito para a TV paga. Em qual canal? A Simba já sondou as operadoras em busca de uma sintonia exclusiva? Alguma operadora já sinalizou com a possibilidade de abrir espaço a um novo canal? Nos últimos anos, as operadoras tiveram de abrir espaço para canais HD e, por lei, para os canais chamados Cabeq (Canais Brasileiros de Espaço Qualificado), que somam pelo menos 12 horas diárias de produção, excluindo jornalismo e esportes, por imposição da Lei da TV paga. Posto isto, todo canal que entra presume que outro canal saia, para equilibrar a conta da mensalidade do assinante. Tudo o que o setor não quer, neste momento, é ter de arcar com novos canais a serem remunerados.
  8. Como a Simba produzirá conteúdo inédito, se as três emissoras em questão recorrem a reprises e programas religiosos em larga escala para honrar a própria grade da TV aberta? Bom, essa é uma outra questão, mas convém pensar no assunto.
  9. Se a audiência desses três canais deixará de ser contabilizada no saldo de audiência da TV paga, é bem possível também que esses canais percam algumas migalhas. O assinante que antes zapeava o controle remoto em busca de algo e batia de frente com um programa que lhe interessava no SBT, na RedeTV! ou na Record poderá esbarrar em outras atrações num dos outros cento e tantos canais disponíveis e nem voltar sua TV para o digital aberto. Essa audiência cativada no zapping se perderá. Será preciso que o assinante queira muito ver determinado programa em um dos três canais abertos e tome a iniciativa de correr atrás do que lhe interessa.
  10. Os dois lados sairão perdendo, e será um porre, para o assinante, ter de ficar entre o digital aberto e o sinal da TV paga, mas, juntando todas as contas, desconfio que a TV aberta tenha mais a perder do que a paga. A TV paga poderia pagar 1 real por assinante para a Simba (33 centavos para cada canal por cabeça, ou 18,6 milhões divididos pelos três, o que resultaria numa soma nada desprezível de 6,2 milhões por mês para cada uma). Sim, a TV paga poderia repassar essa miséria ao consumidor, avisando que a conta foi imposição de RedeTV!, Record e SBT. Mas o espectador, como diziam as manifestações de junho de 2013, poderá se revoltar, ao modo “não é pelos 20 centavos” (no caso, aqui, 1 real). Resta também saber se as três redes abertas se venderiam por isso ou se querem mais, como se especula. E quem não tem o mínimo interesse em RedeTV!, Record e SBT ficaria ainda mais revoltado com 1 real extra na mensalidade.

 

Em tempo: A NET colocou anúncio no ar informando que continua negociando com os três canais, por meio da Simba.

 

 

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