Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Cada um na sua tela: consumo individual motiva nova ferramenta para medir audiência

Bart se isola no computador, sob o olhar de Homer, Margie e Lisa / Divulgação FOX

A larga oferta de vídeos por meio de tantos serviços de streaming alimenta (e também se alimenta de) uma tendência de consumo individual de telas, inclusive em uma mesma casa. Em razão da diversidade de ofertas e em busca das particularidades que movem cada consumidor, a Kantar Ibope Media está lançando uma nova ferramenta de pesquisa para identificar quem vê o quê e em qual aparelho, a fim de estender as motivações de cada consumidor.

O Focal Meter, novo aparelho de medição de audiência, fará companhia ao People Meter, tradicional medidor de consumo de TV, criado nos anos 1990. Embora ele venha se adaptando a novos modelos de consumo nesses 30 anos, identificando a sintonia dos canais por meio do áudio, a presença de outras telas, que não de TV, em uma mesma residência, nem sempre são capturadas com precisão.

Assim, metade dos lares com banda larga que já fazem parte da amostra da Kantar Ibope receberão o Focal Meter. Em conversa com o TelePadi, as executivas Melissa Vogel e Adriana Fávaro, CEO e diretora comercial do instituto, respectivamente, relatam que o Focal Meter já está em teste em 20 residências na Grande São Paulo, maior mercado de consumidores do país e principal fatia publicitária brasileira.

“A gente deveria estar instalando os outros aparelhos neste momento. Paramos por causa da pandemia”, conta Melissa. “O plano envolve a implantação do Focal Meter em residências da amostra com banda larga, seguindo a representatividade da penetração da banda larga nas regiões monitoradas”, diz Adriana.

As duas falam longamente sobre a importância de se identificar o comportamento individual do consumidor, algo fundamental para uma produção de conteúdo que multiplica investimentos para nichos, sem perder de vista o volume de massa que tanto interessa ao mercado publicitário.

São, afinal, os anunciantes que pagam a conta da maioria das empresas produtoras de conteúdo, excluindo Netflix e HBO, que vivem de assinaturas. Mas, no fim das contas, todos os interesses se concentram em atrair a atenção da plateia.

“O Focal Meter identifica também o ID do dispositivo conectado e, a partir das informações que temos do painelistas, podemos atribuir o consumo individual para cada dispositivo, mesmo em caso de devices compartilhados”, completa Melissa.

Ao mesmo tempo em que empresas de pesquisa de mercado buscam dados individuais de consumo, as pessoas também se policiam para evitar que seus dados sejam expostos. A questão ética envolvida no contexto de um mundo tão vulnerável ao vazamento de informações pessoais é um dos pontos abordados pela Kantar Ibope em um recente dossiê apresentado aos seus clientes, produtores e distribuidores de conteúdo, agências publicitárias e anunciantes, ao qual o blog teve acesso.

A medição individual de telas e a identificação de seus consumidores é também uma maneira de a Kantar Ibope impor sua relevância em um mundo onde o Google Analytics nos entrega a cobiçada audiência em tempo real, aparentemente sem custo algum. O Google Analytics, no entanto, lembram as executivas, não fornece gratuitamente tantos dados focados no consumo individual.

Na mostra da Kantar, cada indivíduo da residência onde o aparelho é instalado tem seus dados pessoais identificados pelo instituto. O painel de pesquisados obedece a critérios de região e classe social com base nos dados do IBGE, a fim de produzir um retrato do consumo que alimenta a publicidade.

Voltando ao Google Analytics, cito que a medição em tempo real é “aparentemente sem custo”, mas convém lembrar que não existe almoço de graça. A ferramenta da empresa para mensurar tudo o que diz respeito ao consumo de internet é um interesse do próprio Google, que através do Google Adsense, é intermediário de muitas empresas anunciantes que investem na chamada publicidade programática, aquela baseada em algorítimos. É por isso que quando o sujeito pesquisa, por exemplo, os voos para determinada localidade, imediatamente começam a pipocar na sua tela anúncios de empresas aéreas.

É dentro desse universo que a Kantar avança para não perder relevância. Mesmo sabendo que a televisão linear ainda domina o comportamento do brasileiro, com larga vantagem, a empresa tem trabalhado para contemplar todos os meios de consumo audiovisual.

E embora o brasileiro ainda veja mais TV pelo televisor, o púbico que consome seu conteúdo sob demanda não só aumenta com grande velocidade, como também representa um grupo de alto poder aquisitivo, e portanto, de consumo.

A pluralidade de ofertas e nichos no consumo de entretenimento é reflexo de um avanço tecnológico que apresenta opções cada vez mais acessíveis de conexões e telas, mas isso caminha junto com uma reivindicação mundial de respeito a diferenças. Vejo particularmente com fascínio a maneira como se desenha a ampliação desse leque de ideias, a partir de debates em torno de gêneros e raças.

É por isso que paralelamente às ferramentas usadas pela Kantar ou pelo Google, as empresas de produção e distribuição de conteúdo audiovisual que já entenderam a relevância dessa fragmentação de consumo e a importância de conhecer sua plateia, cabeça por cabeça, também vêm investindo na precisão de um banco de dados de valor inestimável.

A Netflix, por exemplo, procura trabalhar com os perfis distintos que compõem uma assinatura. Já a Globo busca um ID único de cada cidadão que consome qualquer um de seus produtos -jornal, TV, TV paga, portal de notícias ou streaming, usando recursos que abrangem um universo gigantesco. Cada vez que um sujeito vota pela primeira vez no paredão do BBB, por exemplo, ele deve se submeter a um breve cadastro, que será usado quando ele acessar o G1, o Globoplay ou o Globosatplay, caso seja assinante de TV paga.

Para concluir, devemos lembrar que um dos efeitos mais interessantes da pandemia, principalmente durante o período de maior rigor, entre março e junho, foi ver a família voltar a se reunir em torno de uma mesma tela, de um modo que há muito não se via. A excepcionalidade da situação só reforça o quanto tem sido latente o hábito do consumo individual de telas.

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Cristina Padiglione

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