Mion amplia sua voz na TV graças a termômetros de outras telas
Até bem pouco tempo atrás, seria inimaginável que a Globo alterasse, em questão de três meses, planos oficialmente anunciados para sua preciosa programação, como se deu agora com Marcos Mion. Anunciado para ficar à frente do Caldeirão nas tardes de sábado apenas até dezembro, como um tapa-buraco de Luciano Huck, ele foi efetivado no posto para 2022, com direito a comunicado formal reconhecendo a mudança de direção na nau “Globola”, como ele já apelidou a Globo.
A decisão mereceu até a chancela de café da manhã com Ana Maria Braga.
O fenomenal engajamento alcançado por algumas figuras nas redes sociais, hoje, é capaz de servir como termômetro decisivo para o futuro de um profissional, sobretudo um comunicador. Não que isso, por si só, esgote outros critérios –é evidente que a audiência da TV ainda tem peso essencial nisso. Mas não estamos falando meramente em números, nem de audiência nem de seguidores, e sim no potencial que o sujeito tem para conversar com essa massa.
Tampouco se pode tratar esse como fator central em qualquer ofício. É preocupante, por exemplo, que produtores de casting se apeguem a número de seguidores em redes sociais como critério para escalar atores para filmes, séries e até novelas, mas isso já vem ocorrendo e deve ser duramente combatido. É evidente que fã-clube não assegura vocação para representar –nem para cantar, ramo onde isso atiça onze entre dez agentes musicais interessados apenas no negócio, longe de qualquer coisa que se possa chamar de arte.
Mas para um comunicador, o cenário ditado por Instagram, Twitter, Tik Tok e companhia, inevitavelmente vale e valerá cada vez mais como critério de engajamento. Houve um tempo em que bastava alcançar 50 pontos no Jornal Nacional ou na novela das nove, que o anúncio estava garantido. Não é à toa que esse parâmetro perdeu quase metade do teto.
A distração do espectador com outras telas não caminha sozinha. Ela reduz a plateia da TV linear e ao mesmo tempo exige dela que seja menos passiva e mostre capacidade de se comunicar com um espectador que antigamente deixava a TV ligada no mesmo canal, sem disposição para procurar outras alternativas, ou mantinha a TV ligada invariavelmente, até enquanto tomava banho.
Faz-se necessário à TV que ela ofereça à plateia a chance de interagir com seu conteúdo. A TV já não fala ao público sem se importar com o que ele também tem a dizer. É uma via de mão dupla. A TV de modo passivo é cada vez mais obsoleta: embora ainda tenha força, acumula perdas irreversíveis nesse comportamento.
Viva a decisão da Globo em saber ouvir o que esse sujeito tão bem soube expressar em poucos meses à frente do seu Caldeirola, imprimindo sua marca no horário com absoluta competência.
Viva o Mionzeira, que não economizou deslumbramento com a nova tarefa e soube valorizar, no conjunto da obra que sua imagem entrega ao público, conceitos de família e ações solidárias.
É verdade que ele não começou ontem, mas, mesmo falando a tanta gente via Instagram ou Twitter, nunca encontrou um público tão grande a quem falar, donde se conclui também que a TV linear, por mais perdas que venha acumulando, está longe de ser desprezada no bolo de quem pretende conversar com a massa. Se ela souber se adaptar a essa via de mão dupla aqui mencionada e descer do pedestal, corrigindo em curto prazo decisões equivocadas, o seu futuro ainda é de longuíssimo prazo.