Soberana, Chica Xavier foi cota quase solitária na TV por muito tempo
Costumo dizer que as divas morrem no sábado pela manhã, em tempo de alcançar espaço no jornal de domingo, normalmente o mais lido da semana, e tumultuando o fechamento da edição, também aquela que é planejada com mais antecedência para trazer reportagens especiais. Assim foi com Hebe Camargo, que morreu num sábado pela manhã, com Marília Pêra, José Wilker (um divo), e agora, Chica Xavier, que morreu ao raiar deste sábado (8), aos 88 anos, para atiçar nossa memória afetiva sobre o que há de mais terno na figura de uma matriarca.
Baiana de Salvador, Chica estava internada no Hospital Vitória, na Barra da Tijuca, no Rio, tentando driblar um câncer. Atriz de tantas novelas e séries, ela trazia 46 produções de TV no currículo e nove filmes,incluindo o clássico “O Assalto ao Trem Pagador”.
Por 60 desses quase 70 anos de televisão no Brasil, foi cota quase única de negros na TV, ao lado de Ruth de Souza, que morreu há exato um ano e dez dias, Tony Tornado, Milton Gonçalves e mais alguns poucos.
Papel para ela não faltou, mas, como acontecia até bem pouco tempo atrás, a maioria das personagens era em novelas e séries sobre escravidão ou em funções de serviçais, da cozinha ao tanque, herança igualmente escravocrata.
Mas Chica foi mais. Tinha o olhar de quem não se submetia jamais à condição de um tronco, uma sabedoria de vida impregnada na expressão facial, que impunha respeito só de surgir na tela, sem palavra dizer. Adorável. Soberana.
Chica esteve em “Sinhá Moça”, “Renascer”, “Memorial de Maria Moura”, “O Tempo e o Vento” (na versão original), “A Cabana do Pai Tomás”, “Ossos do Barão”, “Dancin’Days”, “Tenda dos Milagres”, “Por Amor” e “As Noivas de Copacabana”, entre tantas outras produções. Seu último trabalho foi na ótima “Cheias de Charme”, em 2012.