Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Comercial com Tiago Leifert rompe muro entre jornalismo e publicidade na Globo

Tiago Leifert, em comercial do intervalo exibido pouco antes do noticiário que apresenta sobre a Copa

Tiago Leifert, no comando do Central da Copa, pouco depois do comercial

Aconteceu.

Se já vinha sendo ensaiada na teoria, a participação de figuras do Jornalismo da Globo na publicidade agora se consuma na prática. Tiago Leifert, um precedente para abrir aos jornalistas da emissora a chance de fazer comercial, protagoniza, neste momento de Copa do Mundo, uma campanha de empresa de telefonia e internet, estando agora não como apresentador de programa de entretenimento, mas sim como apresentador de um noticiário – noticiário esportivo, vá lá, mas noticiário. Não é ficção, não é show, é jornalismo.

Falamos sobre isso neste TelePadi quando o assunto começou a ser discutido internamente entre os profissionais do Jornalismo da Globo. Ao transitar do Jornalismo para o Entretenimento, Leifert passou a estar apto a fazer publicidade. O contrário se deu com Felipe Andreoli, que entrou na Globo pela área do entretenimento e depois foi convocado a fazer o “Globo Esporte”. Quando chegou ao Jornalismo, o rapaz já tinha aval para vender anúncios.

Traçada essa coreografia digna de Escravos de Jó, de quem tira, põe e deixa ficar, outros profissionais do esporte, todos com rostos bem cobiçados pelos altos cachês de campanhas publicitárias, passaram a cobrar da Globo o direito de também aceitar embolsar todo o dinheiro representado por esse universo.

O aval foi dado e estendido a locutores. Agora, com Leifert no papel noticioso, mas brecha aberta à publicidade, deu-se o choque de ver no vídeo alguém que anuncia nos intervalos e lhe transmite notícias, em tese sem interesses comerciais, logo em seguida.

Por mais que o mundo esteja mudando e novos modelos comerciais se desenhando, é uma mistura mais do que complexa. Amanhã ou depois, se as marcas que os jornalistas anunciam nos intervalos vierem a patrocinar um time ou atleta noticiado logo a seguir, qual a distinção que o público poderá fazer entre os interesses daquela mesma figura, dividida pelo conflito entre a notícia e a publicidade?

Ou, pior que isso, a confusão entre publicidade e jornalismo na área de esportes implica assumir a condição de que o esporte nunca foi exatamente alvo de noticiário na televisão e no rádio, onde direitos esportivos, a depender de terem sido adquiridos ou não por uma emissora, determinam qual o espaço dado a ele nos telejornais. Pacotes de futebol e Fórmula 1, por exemplo, já são vendidos ao mercado publicitário com a previsão do número de chamadas nos intervalos. Ou seja, por menos notícia que justifique um boletim de Fórmula 1, muitas vezes ele garante seu espaço num “Jornal Nacional” apenas para atender à promessa feita aos anunciantes sobre o número de inserções da sua marca naquele horário – é quando você ouve, no break anterior ou posterior ao bloco da notícia, o anúncio: “Fórmula 1: Oferecimento:…”.

Negócio puro, com Jornalismo em segundo ou terceiro plano.

De todo modo, isso abre um precedente para que jornalistas de economia, política ou cultura possam pleitear os mesmos direitos. Joelmir Beting, não custa lembrar, foi demitido da Globo por fazer comercial para um banco.

Um cachê de campanha publicitária pode valer mais que um ano inteiro de salário, como se sabe. Não será fácil resistir a essa equação, tentadora para a empresa e para o profissional, ainda mais em tempos de crise. E quando a coisa fica assim numa Globo, marca tradicionalmente ciosa de seu valor editorial, significa que nos outros canais, mais necessitados de verba publicitária, a confusão entre esses papéis já é maior.

 

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Cristina Padiglione

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