Da internet à TV, Trace valoriza DNA africano e alcança consumidor valioso
Quer notícia boa?
Fundada em 2003 na França, a Trace, plataforma que viria a se desdobrar em vários formatos, da internet às TVs paga e aberta, só chegou ao Brasil em novembro passado. Em menos de um ano, o Trace Trends, no ar em horário nobre pela RedeTV!, é uma das iniciativas mais bem cotadas pelo departamento comercial da emissora e serviu de passo inicial para a chegada do Trace Brazuca, primeiro canal pago voltado à valorização da cultura afro, hoje presente nas operadoras Claro/Net e Vivo.
Quem foi o “jênio” da publicidade que perpetuou a ideia de que preto não vende ou que o público de alto poder de consumo não quer ver preto na TV? Alguém que certamente não tem noção alguma sobre orgulho de suas origens e das estatísticas afrodescendentes no país. Vamos a elas.
O Brasil é o país com maior número de pretos depois do continente africano, um público de 120 milhões de afrodescendentes que movimentam R$ 1,6 trilhão ao ano -R$ 86,6 bilhões é a renda anual de moradores de favelas e periferias, em sua maioria representada por negros.
Não à toa, 94% dos afrodescendentes no Brasil dizem que não se sentem representados em propagandas, mas, veja só, 64% afirmam que comprariam mais de marcas que as representassem.
Cerca de 24% do PIB brasileiro é representado pelo dinheiro que circula entre pretos, que são metade dos empreendedores do país. Isso certamente explica por que o Trace Trends, na RedeTV!, tem patrocínio do Bradesco, das Casas Bahia e da Vivo, anunciantes que têm ciência do consumo representado pelo público afrodescendente.
“A gente quer falar de cultura afro e de preto não só quando a notícia é sobre racismo”, diz AD Júnior, coautor da iniciativa de trazer a Trace ao Brasil, ao lado de José Papa Neto, o Zizo, que já foi CEO do Cannes Lions e da WGSN Global, hoje Chairman Global da Bett.
“A gente fala de música, das tendências de países africanos, de empreendedores, de iniciativas que não viram notícia. Fazer barulho para dizer que vidas pretas importam é muito valioso, mas a gente não quer virar notícia só quando alguma coisa de ruim acontece. O Brasil é afrourbano e agente não coloca essa coisa no lugar que ela deveria ocupar”, continua AD.
“Essas pessoas precisam estar no pódio e não em um lugar de segmento, não somos um segmento. Essas pessoas estão contando uma história, não é só de dor que vive uma pessoa da favela, onde está concentrada a maior fatia de pretos. A Trace é esse lugar onde a gente não vai ver só violência, a gente quer projetar o que vem sendo feito de positivo.”
Até o fim do ano, a Trace lançará uma premiação voltada aos seus propósitos de valorizar o empreendedorismo e a cultura afro no país, a Trace Impact Awards, além de um projeto mais ambicioso e que promete trazer transformação para a situação de pretos e descendentes no Brasil: a Trace Academia, uma escola online que ajude a financiar a formação profissional de muitos jovens sem condições de realizar seus sonhos.
É um passo concreto para a ascensão real de um povo que vem sendo trapaceado desde que seus ancestrais chegaram ao Brasil.
“Muitos jovens em países emergentes se perdem com um sistema de ensino desigual, existe também uma grande dificuldade de ingressarem em cursos tradicionais que proporcionariam o conhecimento que eles precisam, mas em formatos que não tornam esse custo-benefício sustentável”, explica a proposta da Trace Academia. A empresa ouviu as necessidades desses jovens e, a partir disso, buscou soluções que poderiam funcionar em todo o mundo: uma plataforma de aprendizado online voltado à nova geração.
Projetado para a realidade de países emergentes a plataforma no Brasil contará com 20 cursos iniciais e tem lançamento também previsto para este ano.
Jornalista e ator convidado a apresentar o Trace Trends com AD, Alberto Pereira Jr. hoje acumula funções de roteiro e direção para o programa e outras atrações do canal Trace Brazuca. (624 na Claro NET e 630 na Vivo), também em parceria com a Vivo e o Bradesco
“A Trace é francesa e está em 162 países, alcançando 300 milhões de pessoas no mundo todo. Aqui, a gente se olha, enquanto sociedade brasileira, muito menos preta do que os outros nos olham. Falar preto ou negro aqui era uma ofensa, há os eufemismos, a gente precisa desse orgulho, de saber se olhar e ter onde se olhar”, diz Alberto.
A presença dele na frente e atrás das câmeras não é caso isolado. As plataformas da Trace acumulam pretos nos bastidores e diante dos holofotes, reforçando a premissa de gerar identificação a quem nunca teve muitas referências na TV e na mídia, de modo geral.
Alberto lembra ainda que o programa foi lançado na RedeTV! em 20 de novembro, dia da Consciência Negra. “O Trace Trends vai ao ar às terças, mas o lançamento foi excepcionalmente na quarta para cair no dia 20: já era um pé na porta da TV brasileira. Já tivemos programas com recorte de preto, como “Manos e Minas”, na TV Cultura, o “Esquenta” não era pra preto, mas abarcava bem a periferia, o “Mr. Brown”, mas eram sazonais, de dramaturgia ou segmentados. A nossa ideia era falar para todo mundo e esse é o desafio de ser TV aberta e TV fechada.”
Comunicador e influenciador digital que é referência na produção de conteúdo sobre combate ao racismo e preconceito na mídia, AD acredita que o momento de pandemia é propício para a discussão sobre o lugar do preto na nossa sociedade e a reflexão sobre o racismo estrutural.
“Pela primeira vez o Brasil está sentado dentro de casa e não tem pra onde correr. Antes, a gente tinha um grupo que nas férias viajavam pra fora e ficavam postando fotos de passeios. Agora, a gente tem que saber qual é a realidade do seu país, e vão ver que os não negros brasileiros entraram numa discussão que os americanos entraram na década de 60, os brancos começaram a falar disso ali, e os brasileiros puderam fingir até um lugar. Com a morte de milhares de pessoas, o brasileiro ficou dentro de casa, não tem como pegar um avião e mandar foto do Marrcoso falando ‘Namastê’.”
No Trace Treds, os meninos fazem entrevistas com artistas que valorizam a cultura afro, do blues ao trap, passando pelo samba, conversam com escritores, músicos, estilistas, empreendedores e contam histórias de pessoas que souberam transformar seu entorno social por meio de seus talentos. Gente como Marcelo D2, Elza Soares, Elisa Lucinda, Crioulo, Djavan e tantos outros já bateram ponto por ali.
No canal pago, as atrações incluem uma revista semanal que apresenta notícias de representantes de toda a diáspora africana pelo mundo, seção que também faz parte do programa na TV aberta. De novo, a proposta é entreter e trazer para a tela narrativas que possam gerar identificação e transformar os estratos sociais. Há ainda uma playlist dos maiores hits africanos do momento. Aliás, a Trace conta também com uma plataforma musical, a Trace Play.
O canal sugere ainda filmes e documentários voltados a causas afro e produções feitas pela própria Trace ao redor do mundo, como o “Afrobeats: da Nigéria para o mundo”, um documentário musical que conta como esse gênero musical influenciou artistas do mundo todo.
Há também o Trace – Sua Voz, série de pílulas de 1 minuto com mensagens de representantes da
sociedade civil e de organizações sociais sobre um tema específico, e o Gospel Vibes, que reúne o melhor do gênero no Brasil.
A Trace se apresenta como uma empresa global multiplataforma de mídia e entretenimento que se conecta com públicos multiculturais por meio da música a de conteúdo afro-urbano premium. Está presente em 27 canais de TV paga, rádio, serviços online e mobile disponíveis para 300 milhões de pessoas, em 162 países. Lançada em 2003, a Trace tornou-se marca líder de mídia para juventude afro-urbana conectada na África Subsaariana, França, Caribe, Inglaterra e região do Oceano Índico.
“O cantor que anda de jatinho e só está na foto para ostentar seus bens não entra na Trace. A gente quer saber o que ele devolveu pra sociedade, daquilo que ele conquistou”, avisa AD.
“O Trace veio para a TV aberta para reparar essa falta de representatividade e de histórias positivas, e traz um diálogo entre Brasil e África”, completa Alberto. A gente só conhece esterótipos. E como o programa também é exibido mundialmente, indo para Angola, Moçambique, França e Portugal, a gente também está exportando nossa visão do Brasil”.