Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Domingos Montagner, 1 ano depois: tragédia justifica ausência de ‘Velho Chico’ das exportações?

Domingos Montagner, morto há um ano, por afogamento, no Rio São Francisco, em Sergipe

Um ano após a morte de Domingos Montagner nas águas do Rio São Francisco, por afogamento, pouco antes do fim das gravações da novela “Velho Chico”, a Globo mantém o título ausente de seu catálogo de vendas internacionais.

Ainda em janeiro, ao constatar que a Globo levaria para a Natpe, feira de TV  em Miami, as novelas “A Lei do Amor” e “Sol Nascente”, ambas ainda no ar na ocasião, mas não “Velho Chico”, então já encerrada, questionei se a ausência da trama de Benedito Ruy Barbosa ocorria em função da tragédia que vitimou seu protagonista, no principal cenário da história. “A seleção dos produtos que oferecemos em nosso catálogo obedece a critérios artísticos e de negócios”, justificou a emissora, por meio da assessoria de imprensa responsável pelas vendas ao exterior. “A obra precisa fazer sentido no mix de produtos que compõem a oferta que levamos a cada uma das feiras. É isso que define o timing e o formato com que cada uma chega ao mercado internacional.”

A Globo não soube informar qual destino seria dado à novela lá fora nem se havia a chance de uma reedição que poupasse o público, em outros países, da ausência do ator nas cenas finais. Aqui, por decisão do diretor artístico Luiz Fernando Carvalho, a obra foi concluída com cenas em perspectiva, colocando a câmera como se fosse os olhos de Santo, o personagem de Domingos. Os demais falavam com Santo olhando, portanto, diretamente para a câmera, o que colocava também o espectador na posição do personagem, já que a perspectiva vinha do seu ponto de vista. A solução foi bastante elogiada, foi um tratamento delicado e serviu como homenagem ao ator, mas seria estranho levá-la ao exterior sem legendar uma justificativa sobre a ausência física do herói da história em cena, bem no desfecho.

De todo modo, há duas sequências gravadas por Domingos que poderiam perfeitamente encerrar a história em uma reedição para o mercado internacional: a primeira, quando Afrânio, o sogro vivido por Antonio Fagundes, reconhece em Santo um grande homem, e de certa forma faz as pazes com o mundo; a outra, com Camila Pitanga e Gabriel Leone, sua mulher e seu filho no enredo, justamente a última cena gravada por Domingos, pouco antes do mergulho fatal naquele 15 de setembro de 2016.

O fato de a Globo alegar que “Velho Chico” é muito regional para ser aceita lá fora não cola. A história aborda o descaso do homem com o meio ambiente, um tema universal, tendo como linha de frente um romance repleto de empecilhos, como convém a todo folhetim de sucesso. Abastecida por uma trilha sonora de raro bom gosto em novelas, com imagens e interpretações dignas de uma belíssima produção, “Velho Chico” merecia estar no time de ofertas sugeridas pela casa ao mercado internacional, devidamente editada para poupar os espectadores internacionais de uma tragédia que é mais nossa do que dos outros. Aposto eu, com licença pela ousadia de pensar por Domingos, que o protagonista adoraria ver em alguma vitrine internacional esse grande trabalho, não só dele, mas de toda uma equipe empenhada em driblar com maestria uma indústria viciada em fazer mais do mesmo.

 

//telepadi.folha.uol.com.br/velho-chico-fica-de-fora-do-catalogo-de-vendas-internacional-da-globo/

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Cristina Padiglione

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