Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

‘Eu considero Magda uma luta feminista’, diz Marisa Orth na reestreia do #Provoca

Marcelo Tas entrevista Marisa Orth na abertura da 3ª temporada do #Provoca. Foto: Nathalie Bohm/Divulgação

Marcelo Tas chega ao 3º ano do #Provoca nesta terça-feira (2), pela TV Cultura, com uma das melhores, senão a melhor entrevista feita até aqui no programa, uma repaginação do “Provocações”, título que fez história na emissora com o adorável Antônio Abujamra (1932-2015).

Marisa Orth ocupa esse espaço com inteligência, franqueza, análises psicológicas -não é força de expressão, ela de fato tem formação em psicologia- e, a seu modo, um deboche que prima pela elegância.

Após algumas entrevistas remotas e outras presenciais desde o início da pandemia, Tas explica nesta reabertura do #Provoca que tem intenção de fazer conversas in loco sempre que possível, e isso já se dá nesta primeira edição do ano. Que bom. Porque o câmera pode aproveitar, em closes, cada desenho nas expressões da entrevistada, alguém que se reconhece como “uma chata”, altamente dramática, mas que invariavelmente faz o seu interlocutor rir.

Embora bem preparado para abordar todos os assuntos necessários, Tas perde o tom de provocação, sem prejuízo para a conversa, para se permitir dizer que está apaixonado pela entrevistada. Rápida e engraçada, Marisa é de desmontar qualquer sabatina e não refuta provocações.

“Por que as pessoas têm dificuldade de perceber que Caco e Magda [‘Sai de Baixo’] são uma crítica e não uma exaltação?”, pergunta-lhe Tas.

“É uma mania de matar o bobo da corte e deixar o rei vivo, né? É maravilhoso”, ela reage, rápida. “Tem gente que me diz ‘Ah, a Magda não poderia existir hoje, né?’ Eu digo: ‘Não, não tem mais nenhum homem corrupto com uma mulher burra’. […] Eu considero o personagem Magda uma luta feminista, me desculpe.”

“Explique”, quer saber Tas.

“Porque várias outras mulheres já vieram pra mim e disseram: ‘Ai, quando eu vi você lá, eu fui estudar, fiquei com vergonha estudar'”, ela responde. “A gente usa o humor para mostrar como tem um monte de brasileira louca, falida, cuja única solução é se pendurar num calhorda. Tô falando alguma novidade? ‘E a mulher imbecil, e se objetifica’ [fala com voz de Magda] e ela ‘tudo bem’. Você pintando com cores mais fortes, você joga luz.”

Integrante do último ano do “Zorra”, Marisa estava no meio do furacão que resultou na saída de Marcius Melhem da Globo no ano passado, e tampouco se recusa a falar sobre os episódios de acusação de assédio moral e sexual que recaem sobre ele, mas avisa: “não sou juiz”.

“Como você leu essa situação?”, questiona Tas.
“Com tristeza”, respondeu ela, reforçando que é preciso combater o machismo em todos os meios.
“O jeito com que essa situação foi abordada,você acha que foi suficiente?”, pergunta Tas.
“Acho que sim”, reage Marisa, que continua: “Tá cada vez mais civilizado, e acho que buscarem um tribunal, eu acho mais legal. Eu apavoro com o negócio de linchamento. Eu acho errado. Qualquer linchamento é errado. É um prazer jogar pedra”, completa, citando Maria Madalena. “É um furor, eu morro de medo, entende? A tendência é atacar o homem, o macho, o diretor, que é o acusado de ser agressor, e eu estou totalmente entendendo o discurso da vítima, que eu ouvi. Eu conversei com a Dani [Calabresa], eu conversei com o Marcius [Melhem], que graças a Deus são meus amigos e vão continuar sendo. O Marcius tá pagando um preço bem alto.”

“Justo?”, pergunta Tas.
“Eu não sei, eu não sou juiz, eu não sei, a gente tem que ver. Eu acho que ele passou dos limites, a minha tendência é achar que sim, que ele passou dos limites de poder que o cargo dele dava. Pelo relato de sofrimento das atrizes, ninguém tem por que inventar isso. Não é interessante na carreira de nenhuma atriz ter isso, acho que a Dani não precisava disso. ‘Ah, ela fez isso pra se promover’. Pra onde?”
“Pelo contrário, né, ela teve que ter muita coragem para se expor da forma que ela se expôs”, reage Tas.

Marisa concorda que abordar esse tema favorece futuras resoluções para o problema, levando as mulheres a se manifestarem tão logo se sintam incomodadas.

A atriz fala ainda sobre Regina Duarte, governo Bolsonaro, orientação sexual, psicanálise, cinema e corrupção.

Explica que o Canguru Perneta, uma das posições favoritas de Caco e Magda em “Sai de Baixo”, nasceu de um erro de texto, e lembra da gafe cometida em sua breve carreira à frente do “Big Brother Brasil”, ao apresentar a 1ª edição com Pedro Bial. “Eu tinha vontade de ira de noite lá e soltar eles”, disse, referindo-se aos confinados.

Embora eu tenha tido acesso à entrevista com antecedência, não seria justo antecipar todos esses relatos aqui. Além de spoiler ter limite, o texto escrito não alcança a graça da entrevistada quando narra esses episódios. Tampouco sou capaz de reproduzir a hilária comparação que ela faz entre as reações de brasileiros e  americanos quando vencem um reality show. Parece bobagem, mas a piada diz muito sobre nós.

Nem todo ator que nos faz rir em cena é capaz de nos divertir tanto quando fala de própria voz, como é o caso de Marisa Orth.

O #Provoca na nova temporada inaugura ainda uma seção de invasão do celular do entrevistado, entre aspas, quando Tas retrata o conteúdo que a(o) sua(seu) convidada(o) mais consome em playlists musicais, textos ou outras cenas.

A edição do programa também está mais atenta a intervenções que ilustrem ou completem os temas abordados durante ao conversa.

Macaco velho de guerra na arte de se comunicar, Tas sempre foi capaz de pensar bem fora da caixinha, mas parece agora mais à vontade na cadeira do #Provoca -talvez menos preocupado em pedir licença a Abujamra para ocupar o posto, justamente porque a conversa ali foi tomando as linhas e o tom do titular.

#Provoca: Toda terça, às 22h, na TV Cultura (o programa ganhou 15 minutos a mais)

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Cristina Padiglione

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