Globo projeta para além da TV temas de responsabilidade social, como ensino e transfobia
Esta semana, a novela de Glória Perez, A Força do Querer, encontrou finalmente o momento em que Ivana, personagem de Carol Duarte, consegue revelar à família que é transexual, ou seja, nascida menino, em corpo de menina.
Na semana passada, a novela/série Os Dias Eram Assim encontrou o momento em que Nanda, personagem de Julia Dalavia, recebe o diagnóstico da Aids.
Toda terça-feira, há pelo menos quatro semanas, a série Sob Pressão narra histórias de salvamento em um hospital do SUS, carente de recursos, com casos diretamente relacionados ao dia a dia de todos nós.
Em todos esses programas, os assuntos são motivados e repercutidos, numa via de mão dupla, por uma área da Globo chamada “Responsabilidade Social”. Desde a estreia da atual temporada de Malhação (Viva a Diferença), esse núcleo passou a produzir também uma série de vídeos que atendem como REP (Repercutindo Histórias), mote dos vídeos postados nas redes sociais e na plataforma de Responsabilidade Social da casa após a exibição dos episódios da série Sob Pressão, toda noite de terça.
É claro que muitas dessas abordagens são sugeridas pelos próprios criadores – roteiristas e diretores. Mas, uma vez a par do que será mostrado nos programas da casa, a turma da Responsabilidade Social, que recebe as sinopses e capítulos das novelas com antecedência, procura tirar daquilo o melhor proveito para a reflexão, compreensão e repertório do telespectador. Na contramão, personagens reais exibidos por esses vídeos também pautam outros programas da casa.
Na terça-feira, dia 29, o TelePadi acompanhou uma bateria de gravações da REP, plataforma disposta a repercutir histórias, dessa vez com dez novos vídeos voltados para a Educação e mais dez vídeos sobre Sustentabilidade.
Os depoimentos gravados para Educação, aliás, histórias da sala de aula previstas para o mês de outubro, que celebra o ofício do professor, foram abertos pela agora famosa mestra Diva Guimarães, que emocionou Lázaro Ramos e chamou para si todos os holofotes da FLIP (Feira Literária de Paraty) deste ano. Na ocasião, dona Diva relatou a cruel herança escravocrata contra a qual muito lutou para alcançar um posto no universo do magistério.
Assim como vem ocorrendo após a exibição de cada episódio da série Sob Pressão, em que um especialista comenta a relevância dos casos abordados, os depoimentos serão veiculados nas redes sociais da Globo. Diretora da área de Responsabilidade Social da Globo, Beatriz Azeredo conversou com o blog entre a gravação de um depoimento e outro.
TelePadi – Essa safra de depoimentos gravados com professores, para falar de ensino, foi motivada pela repercussão que a dona Diva causou na FLIP?
Beatriz Azeredo – Não, a gente está desde 2014 trabalhando fortemente com essa plataforma de educação, a gente trabalha com isso sempre. E todo mês de outubro a gente faz a campanha, com o Arnaldo Antunes cantando, de gente que faz gente. A gente veicula esse filme e fica uma semana com toda a grade de programação falando de educação e falando de professor. Aí, como o REP nasceu este ano, pensamos em fazer um REP sobre Histórias de sala de aula. Isso se junta com a estratégia de influenciar a grade de programação para falar do professor a partir de uma outra perspectiva.
TP – As produções destinadas ao REP são veiculadas nas plataformas de mídias sociais e no site de Responsabilidade Social. Em que medida isso pode ser também aproveitado na programação da TV?
Beatriz – Isso não é feito pra isso. O que acontece, ou pode acontecer, é que o filmete tem duas versões para as mídias sociais, de um minuto e de seis minutos, e os personagens desses filmetes acabam indo para os programas da casa. A Fátima (Bernardes), por exemplo, levou ao programa, em dias diferentes, dois médicos que deram depoimento ao REP. Aí, ela passa o REP no programa, entendeu?
TP – Onde vocês garimpam esse elenco de pessoas que têm uma boa história a contar sobre o foco de cada ação?
Beatriz – A gente sempre faz uma curadoria com os nossos parceiros, que são o Prêmio Educador Nota 10, que a Globo apoia, o Unicef, que é parceira do Globo Educação, e a Fundação Roberto Marinho Acionamos esses parceiros e faz essa curadoria.
TP – O trabalho de vocês pode abastecer a criação de personagens e se tornar fonte para os autores?
Beatriz – A gente faz isso o tempo todo. Por exemplo: na temporada passada de Malhação, do (autor) Emanuel Jacobina, havia duas escolas públicas. Fizemos uma reunião com diretores, professores e convidou a equipe inteira, e o próprio Jacobina, para participar. É claro que isso acaba se tornando uma fonte de temas e personagens. Aí, a gente faz esses encontros. A gente faz o programa da GloboNews, Educação: Mitos e Fatos, é feito por essa área.
TP – Sim, conheci detalhes dessa iniciativa na última edição do RioContentMarket (feira de audiovisual anual no Rio), em um painel que citava também a questão da sustentabilidade abordada na novela ‘Velho Chico’. Aquilo passou também pela área de Responsabilidade Social?
Beatriz – No caso de ‘Velho Chico’ é um super case de oportunidade. A gente recebe antes a sinopse da novela. Aí, vimos que ia ter ‘Velho Chico’. Propus ao diretor e ao autor uma parceria com a Conservação Internacional, que é nosso parceiro. Eles toparam. Então, pela primeira vez, na história da Globo, aparecia, nos créditos finais: “Parceria Técnica: Conservação Internacional”. O pessoal da Conservação Internacional sentou com o Bruno Luperi (autor) a novela inteira, porque eram muitos temas. Aí fizemos um caderno Globo Universidade de Velho Chico, falando do tema, fomos para universidades da região, fizemos minidocumentários com jovens da Universidade Federal Vale do São Francisco, a gente sai fazendo um 360, com tudo o que a gente pode falar sobre isso.
TP – Há cerca de 20 anos, um autor inseria em sua novela, por conta própria, uma questão que poderia render frutos como merchandising social. A Globo foi então organizando uma pauta de causas e contabilizando esses resultados, agora expandidos para as malhas das redes sociais. Em que medida hoje a sua área pauta um autor de ficção?
Beatriz – Eu diria que isso continua: cada autor decide quais temas vai abordar. Eles têm absoluta autonomia nisso. O que existe hoje é uma onda de responsabilidade social que trabalha substantivamente esses temas. Tem dois movimentos: um é a gente oferecer assuntos para o entretenimento, e outra coisa é que, tendo uma oportunidade na história, como aconteceu em ‘Velho Chico’, a gente vai lá e oferece parceria.
TP – Agora, por exemplo no caso da abordagem da Aids na novela ‘Os Dias Eram Assim’, a área de Responsabilidade Social participou da ação que envolveu a história da personagem Nanda (Julia Dalavia)?
Beatriz – Aquilo estava no roteiro das autoras. A gente soube que ela descobriria na segunda-feira passada que estava com Aids, e naquele dia, quando acabou o episódio, a cartela final do capítulo virou para o recado “Aids ainda não acabou”. Isso foi construído com o nosso parceiro, que é a Unaids, e no intervalo entrou o filminho da Unaids, sobre a testagem. A Aids está aumentando entre os jovens e era para incentivar o teste entre os jovens. Esse case foi apresentado na ONU, em uma reunião em Nova York – não esse dessa semana, mas a Unaids nos procurou para falar o quanto essa questão da Aids estava voltando entre a juventude: 40% dos jovens declaram que não usam camisinha! Isso é a margem dos que admitem que não usam, imagine quantos não admitem? A gente fez esse filme que você viu semana passada, que tem uma pegada jovem, com um rapaz praticando slackline.
A gente também ofereceu parceria técnica da Unaids para o Emanuel Jacobina na época de ‘Malhação’. O que ele fez? Ele botou um casal sorodivergente de ensino médio na Malhação, com um garoto que tinha nascido soropositivo e uma menina. Esse casal rendeu um spin-off e virou uma websérie, que contava essa história. Foi a websérie mais vista da história da Globo. Então, esse foi um outro exemplo que foi daqui para lá. A gente ofereceu o assunto para ‘Malhação’.