Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Globo se redime de omissões sobre desfile da Tuiuti com edição do ‘carnaval dos protestos’

'Manifestoche' com camisa da seleção bate panela: referência aos protestos ao governo Dilma

Agora foi.

Melhor corrigir uma lacuna dois dias depois do erro do que esperar anos para acertar contas – e às vezes, nem acertar. A Globo voltou ao tema Paraíso do Tuiuti, cuja transmissão ao vivo do desfile na Sapucaí, na madrugada de domingo para segunda-feira, se fez notar pela ausência de comentários sobre as críticas políticas expostas na avenida.

Na edição de segunda-feira do “Jornal Nacional”, como observou Mauricio Stycer, colunista do UOL, o espaço dado à Tuiuti, escola que mais rendeu polêmica ao longo do dia, foi o menor entre as agremiações que tiveram suas performances resumidas pela edição. Na terça, portanto, o “JN” voltou a mostrar o “vampiro neoliberalista” como uma “alusão ao presidente Michel Temer” e enumerou em detalhes os outros pontos do protesto, até então mal explorados pelos analistas da emissora.

O assunto foi retomado em uma matéria particularmente dedicada a enfatizar que “este carnaval deixou uma marca forte e indiscutível: os protestos contra a violência no Rio de Janeiro e as críticas aos políticos e às questões sociais”. “A Paraíso do Tuiuti desfilou críticas políticas e sociais no primeiro dia na avenida”, inciou o texto, que continuou: “Operários obrigados a se desdobrar denunciavam as más condições de trabalho e criticavam a reforma trabalhista. Carteiras rasgadas mostravam que muitos brasileiros vivem sem direitos no trabalho informal. Os manifestoches  eram uma sátira a manifestantes que são manipulados pelos poderosos. Como se fossem marionetes, eles estavam encaixados no pato da Fiesp, um dos símbolos dos protestos contra o governo Dilma e carregavam uma panela, em referência aos panelaços da época. No último carro, um vampiro vestia a faixa presidencial, numa alusão ao presidente Michel Temer. A fantasia do destaque ganhou o nome de ‘vampiro neoliberalista’.”

Tudo veio explicadinho – se bem que não é possível cravar que carteiras de trabalho rasgadas se referissem apenas ao “trabalho informal”. Sendo a crítica à reforma trabalhista, como admitiu a edição, o dedo também aponta para a legalização de práticas que antes protegiam o trabalhador e foram rasgadas após a reforma.

De todo modo, a volta ao assunto, da forma como aconteceu, foi um grande avanço. Em seguida, a reportagem destaca os protestos da Mangueira contra o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, e o “recado claro” da Beija-Flor à violência, aos corruptos de malas cheias de dinheiro, com menção à Petrobrás e às mazelas do Rio, como bala perdida, arrastões, e policiais mortos. Blocos de rua também entraram na edição, com mais críticas a Crivella, repetindo um conteúdo que já tinha sido abordado, agora reunido no pacote do carnaval do protesto.

Este noticiário apurou que os narradores e comentaristas do desfile no Rio não estavam preparados para a imagem dos patos da Fiesp, manifestoches com camisas da seleção e o vampiro neoliberalista de Temer. O time responsável pelos microfones de fato visita os barracões de escolas com antecedência e toma ciência de seus destaques, bem como do samba enredo e seu tema central.

Alex Escobar e Fátima Bernardes na visita à escola Paraíso do Tuiti, com Jack Vasconcelos

Mas, no caso da Tuiuti, as informações repassadas a Fátima Bernardes, Alex Escobar e cia., segundo me contou uma fonte que prefere não se identificar, ficaram restritas aos detalhes da escravidão, assunto central do enredo.

Diante do grande protesto trabalhista e político, faltou jogo de cintura ao pessoal da transmissão, que demonstrou insegurança em mencionar Temer, patos e panelas – que, afinal, tiveram tanto destaque na tela da própria Globo nos idos do segundo e breve governo Dilma.

Ora, ora, bastava atribuir a leitura da Sapucaí à própria escola, não era preciso endossar o que ninguém ali na Globo sabia se poderia ser endossado.

O que não é possível é exibir as imagens em questão sem dar a legenda devida ao público, que, a essa altura, já ferve nas redes sociais, ávido por gafes, erros e teorias de conspiração.

 

 

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Cristina Padiglione

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