Nizan pede volta de Mainardi, mas o bom debate dispensa hostilidades
Após três edições sem Diogo Mainardi, Lucas Mendes, âncora, editor e criador do Manhattan Connection, continua a lamentar a saída do sócio do site O Antagonista do programa. O assunto foi puxado na edição desta quarta-feira (19) pelo publicitário Nizan Guanaes, presente à mesa do programa, ao lado de Mendes e Caio Blinder, os únicos remanescentes do time. Pedro Andrade deixou o grupo na semana passada.
“Torço aqui pra que o Diogo volte, quero que a TV Cultura preste atenção nesse assunto, até porque polêmica faz parte desse programa e a gente precisa”, disse Guanaes, para a alegria de Mendes, que emendou: “Eu sinto muito a falta do Diogo nesse programa porque o Diogo, além de ser uma pessoa finíssima… o Diogo não fala palavrão. Aquela expressão que ele usou, ‘vai tomar no cu’, eu usei aqui pra falar do meu avô, que a gente dizia ‘bênção’, e ele dizia ‘vai tomar no cu’. O Diogo não tem nada de sujo, de pornográfico, e o Diogo tem mais leitura que nós, tem mais cultura que nós, tem uma vivência bacana.”
Guanaes reforçou: “O Brasil precisa de debate, o Brasil precisa de repertório, o Brasil precisa de cultura”. O publicitário disse que não está dando razão a ninguém: “Não vi o episódio, mas esse programa é rico, vou pedir a Senhor do Bonfim que aconteça isso aí”.
Quem não viu o episódio de fato não pode achar que o exemplo citado por Mendes se compara ao que ocorreu entre Mainardi e o advogado criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay. Presente no programa como convidado, ele foi hostilizado pelo apresentador, que fechou aquela edição com o dito xingamento, dentro do contexto de quem havia destratado seu interlocutor nos vinte minutos anteriores.
Mendes de novo voltou a tratar o xingamento como uma referência a uma fala de Fábio Porchat, também convidado daquela edição, mas que já havia saído de cena havia mais de 20 minutos. E tudo o que Porchat fez foi falar de Olavo de Carvalho, o guru do presidente, que “manda todo mundo enfiar tudo no cu”.
Alegando pressão da TV Cultura, Mainardi anunciou que se demitiria do programa para não prejudicar o Manhattan.
A questão não é mandar tomar aqui ou ali, mas sim o contexto implicado nesse voto. Tanto assim que Porchat, ao pronunciar a mesma coisa naquela mesma edição, não sofreu qualquer crítica, inclusive porque a menção era, em si, uma crítica ao vocabulário do filósofo do presidente.
Ao longo de seus 17 anos no grupo, o jornalista sediado em Veneza desempenhou muitas vezes a voz da divergência, algo essencial para um bom debate. Sim, a divergência faz falta a qualquer programa de conversa. Mas o sujeito que leu muito e sabe muito, como cita Mendes, em tese tem elementos de sobra para promover o contraditório sem precisar tratar um convidado como “poste de ex-presidiário”, como fez com Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro da Educação, dono de um currículo próprio, e menos ainda como fez com Kakay, dizendo que ele estaria ali para arrumar clientes e que não o convidou para estar no programa.
E nem se pede aqui um nível tão alto, que esbanja elegância, como o das divergências entre Júlia Duailibi e Octavio Guedes no Em Ponto, da GloboNews, os debates mais civilizados e produtivos da TV hoje.
Agressividade e hostilidade só conspiram a favor do embate raso, sem ideias, sem elementos, sem argumentação, abastecendo um modelo que criou fôlego com o patrocínio da milícia digital valorizada pelo atual governo, inimigo de cultura, de livros, de educação, de informação, enfim.
Assim, prezando o que diz Guanaes e Mendes, sim, o Manhattan se fez com polêmicas. A malcriação, no entanto, para ficar em um termo infantil, nada acrescenta à plateia. Criar polêmica à base de agressividade e hostilidade só contribui para a grande conversa de botequim que toma conta das redes sociais e gera polarização rasteira e desinformação, o contrário do que se espera de um programa como este.
O Manhattan pode mais que isso, como quero crer que Mainardi também seja mais que isso, independentemente de eu concordar ou não com suas ideias. Faltou repertório para sustentar divergências, e não é que ele não o tenha, mas, se tem, isso não veio à tona. De nada adianta que os amigos íntimos conheçam uma boa cabeça, se ela produz outros sinais na esfera pública.