Humor de Eva Todor encontrou espaço no tempo de uma TV mais teatral
Nessa brincadeira de buscarmos cada vez mais realismo na teledramaturgia, o que hoje faz vários talentos da tela grande preferirem as séries de TV aos longas-metragens, a televisão foi deixando para trás uma graça que se assemelhava mais ao teatro, ao chamado over acting, num tom, digamos, farsesco, que durante décadas fez muito sucesso com o grande público.
Eva Todor, húngara de nascença, que nos deixa hoje, aos 98 anos, era um ícone daquela TV que valorizava mais o teatro do que o cinema – a não ser que o cinema fosse o da chanchada de Oscarito e Grande Otelo. O próprio rádio, que tanto influenciou a televisão no Brasil, foi perdendo, ao longo dos anos, a empostação que tanto glamour lhe assegurou até os anos 50, empostação esta devidamente valorizada pela TV em suas primeiras três décadas.
Eva sofria de Parkinson. Fez sua última novela em 2012, “Salve Jorge”, e antes da trama de Glória Perez em questão, outras 29 novelas, pelo menos, todas com personagens que traziam uma leveza e algum humor aos dramas narrados.
De formação no balé, como tantas outras veteranas bem recebidas pela TV, Eva já tinha largo histórico no palco quando começou a fazer TV, já na década de 60, com o programa “As Aventuras de Eva”.
Era, com poucas variações, atriz de um papel só, como costumo dizer, o que não é nenhum demérito quando ninguém consegue superar esse intérprete naquele tipo de personagem. Era o caso, por exemplo, de Nair Bello, sempre magistral. Por mais que Eva tentasse imprimir algum drama à interpretação, o público sempre haveria de achar alguma graça na sua dor. Não é feito para qualquer um. Tampouco era escalada para personagens de baixo poder aquisitivo – a imagem refinada sempre remetia a figuras abastadas ou que um dia conheceram a riqueza financeira.
Eva Fodor Nolding, nome de batismo, nasceu em Budapeste e veio para o Brasil em 1929. Casou-se aos 14 anos com o diretor de teatro Luiz Iglesias, o primeiro marido. Na TV, quase foi Dona Pombinha, mulher do prefeito de Asa Branca, Florindo Abelha, na versão censurada de “Roque Santeiro”, em 1975 (a personagem foi assumida por Heloísa Mafalda na produção que de fato foi ao ar, em 1985).
Foi ela mesma em “A Gata Comeu” (1985). Foi Kiki Blanche em “Locomotivas” (1977), personagem que voltaria para uma participação especial no remake de “Ti-Ti-Ti” (2010), foi Lola em “Te Contei?” (1978), Santinha em “Sétimo Sentido” (1982), Morgana em “Top Model” (1989), Calu em “De Corpo e Alma” (1992), Maria do Carmo Canhedo em “Suave Veneno” (1999), Josefa Lacerda de Moura em “O Cravo e a Rosa” (2000), Miss Jane em “América” (2005) e Dona Cidinha em “Caminho das Índias” (2009), entre tantas outras personas.
Nada mais justo que ter encerrado sua cena na TV com Glória Perez, de quem fez cinco novelas na Globo.