Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Lázaro Ramos lança 12ª safra do ‘Espelho’ e fala sobre cenas jamais exibidas

Ao lançar a 12ª temporada do relevante “Espelho”, programa que instiga a reflexão sobre temas pertinentes à realidade do País, Lázaro Ramos avalia que o Brasil mudou muito em 12 anos, e ele, como entrevistador, idem. “Agora já não fico mais 2h30 gravando uma entrevista, pra depois o pessoal sofrer na edição”, disse o ator, em entrevista na sede da GloboSat, nesta sexta. Da produtora Tânia Rocha, que o acompanha desde a 2ª temporada, já ouviu muitas vezes a sugestão de lançar um documentário com trechos inéditos gravados pelo programa e até de entrevistas inteiras que permanecem inéditas.

“Vou contar uma que eu nunca falei”, disse Lázaro. “Eu tenho uma entrevista com o pai de santo de Pierre Verger, olha a história maravilhosa: eu entrevistei o pai de santo de Pierre Verger no interior da Bahia. Ele me mostrou inclusive a casa de Santo de Pierre Verger, eu vi os Orixás de Pierre Verger e quando acabou a entrevista ele falou: ‘o Orixá me soprou aqui no ouvido que não era pra eu assinar a autorização de imagem’. Então, eu nunca pude exibir essa entrevista. Tenho três horas de entrevista e no dia em que o Orixá soprar no ouvido dele pra autorizar, quem sabe a gente exiba, se a fita não tiver mofado. Isso faz uns oito anos”.

O ator grava agora cerca de 40 minutos de conversa para chegar a uma edição de 25 minutos. “Mas acho que eu continuo mantendo a minha não responsabilidade de não me apresentar como jornalista”, fala. Nesse ponto, a presença de um entrevistador que faz mais o papel do telespectador do que do jornalista é um ganho para as conversas, o que fica claro em duas entrevistas exibidas durante o evento de lançamento para esta temporada. Ao ex-secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, Lázaro pede licença para mencionar um assunto que possa lhe ser incômodo: “Sérgio Cabral”, governador hoje preso, acusado do desvio de milhões de reais, que convidou Beltrame para o cargo. O ex-secretário diz que não tinha relações pessoais com o ex-governador, mas avisou-lhe, desde o início, que poderia ser um problema para o seu governo, “porque não sou uma pessoa muito flexível”. Evitou, no entanto, julgar a condição atual de Cabral. E falou sobre a falta de uma política de habitação (municipal, estadual e federal) que poderia ter conspirado a favor do êxito das UPPs, Unidades de Polícia Pacificadora, implantadas por ele nos morros. “E por que não há uma política habitacional?”, quer saber Lázaro. “É o que eu também me pergunto”, rebateu o gaúcho. A espontaneidade do entrevistador no ping-pong de perguntas e respostas é algo ausente na grande maioria dos jornalistas, engessados sob as regras da profissão. Beltrame deu ainda fortes declarações sobre a facção do Primeiro Comando da Capital, o PCC, sendo ele um ex-secretário de Estado. “O PCC existe no Rio e é crime organizado. Eles não saem matando, não ostentam, têm uma meta muito clara que é ganhar dinheiro”, disse.

Outra entrevista que Lázaro obteve e está longe do alcance de um jornalista foi com Leandra Leal, sua amiga, também nesta temporada, a quem trata pelo apelido, “Lelê”. À época do lançamento da série “Justiça”, no Rio, Leandra foi questionada por uma repórter sobre o processo de adoção de uma criança. “Não falo sobre minha vida pessoal”, encerrou ela. Não foi o que aconteceu diante da conversa para o “Espelho”, e ela mesma reconheceu. “Ai, Lázaro, só num programa seu mesmo pra eu falar disso”. E comentou demoradamente sobre Júlia e toda a preocupação que tem em criar uma menina negra no Brasil. “As pessoas diziam pra mim antes: ‘você não sabe o que é isso (preconceito) e eu dizia: ‘é claro que eu sei’. Agora eu posso dizer: ‘não, eu realmente não sabia'”. Moradora da zona Sul do Rio, a atriz disse que só então se deu conta do problema que é a predominância branca na região: a falta de referências para a filha a preocupa. Falou sobre feminismo, convicta que é desta bandeira, e sobre tomar posição política, sim, o que pode até ter um custo, mas infinitamente inferior ao preço de se omitir, sem no entanto tentar catequizar os outros a concordarem com ela.

O “Espelho” terá ainda Agnaldo Rayol entre os convidados desta temporada, e Dira Paes. Como raros títulos da TV, temos aí um programa de fato relevante, que faz diferença na TV, capaz de mobilizar e motivar ideias, pronto para fazer a diferença, amém.

A nova temporada, com 26 episódios, estreia dia 27, às 21h, e estará disponível, aberto para todos, no Canal Brasil Play, plataforma acessada via internet, uma semana depois da exibição de cada episódio na TV. Vale a pena ver. Vale a pena pensar.

 

 

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Cristina Padiglione

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