Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Nem equipe do ‘Tá no Ar’ acreditava que a Globo aceitaria suas piadas

Amaury Júnior, em participação até então improvável na Globo, com Rick Matarazzo (Marcius Melhem) e Tony Karlakian (Marcelo Adnet) / Divulgação

Em um balanço sobre a sexta e última temporada do “Tá no Ar: A TV na TV”, o diretor Maurício Farias, cocriador do programa, ao lado de Marcius Melhem e Marcelo Adnet, contou que após a primeira leitura de texto, um dos profissionais da equipe comentou: “Maravilhoso! Pena que isso não vai ao ar na Globo”.

E foi.

A safra derradeira de episódios inéditos estreia no dia 15 de janeiro, uma terça-feira, com direito a despedida de alguns personagens emblemáticos, como Jorge Bevilacqua (Welder Rodrigues), gritando “foca em mim!”, Tony Karlakian (Marcelo Adnet), Ricky Matarazzo (Marcius Melhem) e o crítico da Globo (Adnet).

O “Tá No Ar” trouxe algumas referências reveladas no passado pelo “TV Pirata” (fim dos anos 80), mas sufocadas pela insegurança comercial e moral dos anos seguintes, na própria TV Globo. Esse é o caso das paródias de publicidade, tão divertidas, e também de citações a outros canais.

Adnet fez Silvio Santos na Globo, desde o primeiro episódio, Melhem reproduziu com propriedade a Velha Surda, grande personagem de Roni Rios em “A Praça é Nossa”, com direito à presença de Carlos Alberto de Nóbrega, Amaury Júnior apareceu para rir de si, católicos (PoliGod), evangélicos e umbandistas (Galinha Preta Pintadinha) viram seus credos como alvo de piada, roteiro que invariavelmente tem o potencial de gerar questionamentos, algo tão saudável para guiar nossas escolhas.

Assim como profissionais da equipe do programa, quem viu o humor da Globo esmorecer nos últimos tempos do oprimido “Casseta & Planeta”, onde a lista de restrições foi crescendo ao longo dos anos pós-“TV Pirata”, cuja criação era assinada por boa parte dos mesmos cassetas, nem acreditava que o conteúdo do “Tá no Ar” era coisa da Globo. Em razão dessa virada, é possível dizer que nenhum outro assunto na emissora sofreu maior renovação que o riso, na troca do comando geral da casa, de Octávio Florisbal para Carlos Henrique Schroder.

De certa forma, o “Tá no Ar” escancara um tom progressista que quase não aparecia no restante da programação.

De certa forma, a ousadia do “Tá no Ar” vem apoiada pelo imenso sucesso alcançado pelo Porta dos Fundos em seu primeiro ano, quando se teve a certeza de que havia muito espaço para um humor ácido, crítico, longe das piadas meramente sexistas e feitas de bordões, como acontecia no velho “Zorra Total”.

A mudança no “Zorra”, hoje bem mais apoiado no noticiário do que nas esquetes manjadas, também surgiu na esteira da segurança adquirida pelo “Tá no Ar”.

Assim, o “Tá no Ar” se vai – e a equipe terá de apresentar nova proposta à direção da Globo para substitui-lo – mas deixa um legado inestimável, calçado na certeza dos limites a serem ultrapassados.

Que venham novas ideias, sem perder de vista a chance de transgredir, sem ofender quem não pode se defender.

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Cristina Padiglione

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