Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Produção nacional da Netflix, ‘Onisciente’ ocupa um nicho mal explorado no Brasil

Carla Salle é Nina em 'Onisciente', nova série nacional da Netflix, dos mesmos criadores de "3%" / Reprodução

É impossível não associar “Onisciente”, nova série nacional da Netflix, à grandiosa “Black Mirror”, série gringa que nos faz arregalar os olhos ao retratar um mundo onde o indivíduo é cada vez mais vigiado.

Mas não é porque alguém falou nisso uma vez, duas ou três que ninguém mais pode fazer uma releitura sobre tal situação. Há uma série inesgotável de filmes sobre o nazismo e uma batelada de histórias, bem ou mal-sucedidas, não importa, sobre magia e bruxaria, antes e depois de Harry Potter.

Quando ouvi pela primeira vez o argumento de “3%”, primeira série brasileira da Netflix, de Pedro Aguillera, mesmo roteirista de “Onisciente”, também pensei em “jogos Vorazes” e “Divergente”, mas então me dei conta do quão mal explorado é este filão por aqui, onde o interesse da plateia pelo segmento não foge ao apetite do resto do mundo.

Daí porque “Onisciente” vale bem a pena ser vista. Numa cidade onde se vende a ideia de que o crime desceu a níveis quase nulos de violência, todos os cidadãos são vigiados por drones. Carla Salle vive Nina, a protagonista, uma geniazinha que luta, e até trai seus princípios, para conseguir uma vaga no seleto grupo de programadores que rege o sistema de segurança do município por meio dos drones, na série  representados por pequenas mosquinhas robóticas.

Nina descobre, antes mesmo de entrar para o sistema (batizado com o nome da série) que ele está longe da perfeição. Seu pai foi assassinado em casa sem que os registros indiquem quem o matou. Sob o pretexto de que tudo é controlado por computadores, ela não consegue acesso às imagens como cidadã comum. Seu irmão, Guilherme Prates, tenta obter informações por meios pouco ortodoxos e quase se enrola com um grupo de bandidos.

Um dos chefes do sistema, logo veremos, reforça a ideia de que nada é o que parece ser naquele modo de vida.

O tom de interpretação dos atores é igualmente robótico, com uma economia de movimentos, interjeições e caretas. Tudo é muito enxuto, mesmo a interpretação da grande Sandra Corvelone. Jonathan Haagensen (“Cidade de Deus”), Marcelo Airoldi e Luana Tanaka, uma promissora atriz, completam o núcleo central.

Cenários e figurinos ornam com o modo quase robótico de interpretar, apontando para o tom futurista do enredo.

No sistema dos drones, a liberdade para questionamentos é quase nula. As pessoas vivem com medo, agora não mais do crime comum, mas do poder exercido pelos mandatários do tal sistema, honrando o universo de Aguillera.

A produção é da Boutique Filmes,também produtora de “3%”, com uma vantagem sobre a finalização da produção, de cenários e recursos menos toscos que a outra série. Em compensação, se a Netflix parece ter investido mais em infra-estrutura dessa vez, faltou verba para a campanha de lançamento, que não houve.

Na contramão dos lançamentos nacionais, houve total silêncio sobre a chegada do novo título. Até lembrei o caso de “Se Beber não Ceie”, primeiro especial de Natal da Netflix, que desembarcou na plataforma de modo quase envergonhado, sem campanha alguma de lançamento, e acabou faturando um Emmy Internacional no fim do ano. Protagonizada por um Jesus do mal, o que não é o caso do Cristo do último especial, alvo até de atentado contra a produtora Porta dos Fundos, o filme foi muito mal divulgado na época.

 

Cotação: BOM

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