Alvo da polarização, Globo se guia por pesquisas, diz chefão
Num cenário em que SBT, Record e RedeTV! têm demonstrado clara simpatia ao atual governo brasileiro, a Globo se mantém fiel a alguma contestação e ao tom crítico necessário ao poder público, chegando mesmo a desmentir o presidente Jair Bolsonaro em algumas ocasiões. Em razão disso, a emissora da família Marinho, tradicionalmente apedrejada pela esquerda, virou alvo de apedrejamento também da direita, por meio de apoiadores do presidente, mesmo enquanto ele ainda era candidato.
Nesse contexto, cabe perguntar como a emissora dos Marinhos vem definindo suas temáticas no entretenimento e no jornalismo, sem risco de perder a clientela, questão que esta jornalista fez ao diretor-geral da Globo, Carlos Henrique Schroder.
A gritaria das redes sociais que atribui à emissora a hashtag #GloboLixo, afinal, encontra eco na sua audiência? Pelos números aferidos pelo instituto Kantar Ibope desde o início do ano, não. Apesar do mau desempenho numérico em algumas faixas horárias, nada evidencia que os pontos mais vulneráveis da programação estejam nessas condições em razão dos protestos ostentados por críticos à linha editorial da emissora.
É verdade que há uma gritaria sob a hashtag #GloboLixo nas redes sociais, mas a emissora, diferentemente da presidência da república,diz não administrar seu conteúdo pelo Twitter, embora tampouco despreze as ferramentas ali disponíveis.
Eis o que diz Schroder a respeito:
“Evidentemente, a comunicação tem um acompanhamento de todas as fontes, e até a gente tem usado, nas temáticas dos nossos programas, um termo que é ‘nuvem de palavras’, é algo que está no mundo digital. Essa é uma ideia que nasceu a partir dessa discussão, mas a gente tem uma ponderação.
Você sabe que às vezes, com 120 tuítes, eu sou trending topics no Twitter, então, a gente toma muito cuidado, a gente faz ponderação o tempo todo porque isso não pode virar uma regra que defina uma atuação dentro de uma temática de novela, não pode definir uma atuação do jornalismo.
É claro que a gente observa o movimento. A gente chama de mapa de calor, a gente vê para que lado está indo a nuvem, para que lado ela se movimenta, porque às vezes ela é insignificante, às vezes ela tem peso, então, a gente pondera o tamanho disso, o tempo todo nós estamos olhando, dia a dia. Tem uma área de centro de atendimento ao telespectador, tem uma análise de análise digital feita pela comunicação e pela área de pesquisa.
Essa é uma medida que a gente tem trabalhado junto à área comercial a ponto de acompanhar pra gente estabelecer novas métricas no mercado, inclusive.
É importantíssimo ter 40 pontos numa novela:? Claro que é, mas tem outras formas de medição, que são tão ou mais importantes, que talvez não tenhamos descoberto ainda.”
Schroder cita que nos Estados Unidos, atualmente, a grande questão é entender quais são as métricas que levam um sujeito a assistir a um programa: Qual é o tempo de atenção dele? Qual é o tempo de engajamento?
“São essas informações que vão nos deixando mais próximos das decisões sobre o conteúdo. Nós começamos a fazer isso agora. Hoje sabemos quanto tempo o sujeito assistiu ao capítulo da novela, em que momento ele saiu, quantas vezes por semana ele e vê. Nós temos hoje um volume de informações que está crescendo por meio da informação digital.”
A cada vez que um espectador quer votar em escolhas que definem vencedores em programas como Domingão do Faustão, The Voice Brasil ou Fantástico, ele deve se logar com seu ID para que a Globo comece a mapear o comportamento desse espectador. Entre mais de 70 milhões que já acessaram algum produto do grupo, inclusive a rádio CBN, os canais Globosat ou o próprio Globoplay, pouco mais de 30 milhões já têm seu consumo de TV conhecido pela emissora.
No caso do púbico que assiste à Globo por meio de sinal de TV paga, a emissora só pode acessar as informações desse espectador quando ele se identifica por alguma plataforma sob demanda do grupo, já que as operadoras não entregam ao canal os dados de comportamento desse assinante.
O método de estudo de comportamento por meio de informações acessadas pelo universo digital permite um conhecimento real sobre o público, o que as pesquisas de opinião e inteligência nem sempre entregam com a mesma eficiência, e não por falha nos recursos.
Ocorre que nem sempre o entrevistado de pesquisas diz a verdade. Muitas vezes, o sujeito tem um comportamento externo e outro entre as quatro paredes. O caso mais emblemático de gente que mentiu em pesquisas, e sempre recorro a esse exemplo, aconteceu com o canal TNT, primeiro canal pago a adotar a dublagem de filmes no Brasil, permanecendo, por anos a fio, na liderança do ranking da TV por assinatura.
Mas quando saiu a campo para perguntar aos assinantes se eles preferiam filmes dublados ou legendados, obteve algo em torno de 50% de escolhas para cada alternativa. As pessoas, souberam depois, tinham vergonha de dizer que preferiam filmes dublados. Os que admitiram atribuíram a opção ao fato de assistirem a filmes com a mãe, a avó ou o filho, sob a justificativa de que outra pessoa na sala, e não o entrevistado, sofria para ler legendas.
Moral da história: nem sempre a gritaria e as respostas de pesquisas correspondem ao que o cidadão faz. É a velha divergência entre fazer o que eu digo e fazer o que eu faço.