Roda Viva exibe independência ao abordar ato de censura proposto por Doria
Fazendo justiça a uma cobrança aqui registrada em post anterior, convém ressaltar que o Roda Viva não se eximiu de mencionar uma ação de censura do governo Doria na edição desta segunda-feira (9), pela TV Cultura, emissora cujos recursos são mantidos, em sua maioria, pelo governo do Estado, no momento comandado por João Doria.
O programa em questão entrevistou o ex-ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso, José Carlos Dias, integrante da Comitiva de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo.
A edição abordou casos de censura e tortura, direitos humanos de modo geral e a equivocada ideia de que isso esteja relacionado a uma pauta de esquerda. Citei aqui, antes da realização da entrevista, que uma boa demonstração de isenção do programa seria a menção à decisão de Doria de mandar recolher cartilhas sobre discussões de gênero das escolas públicas de São Paulo.
Isso foi feito já na apresentação do programa, pela âncora, Daniela Lima, que tem demonstrado surpreendente jogo de cintura para coordenar a roda de entrevistadores, com intervenções e questões oportunas.
É evidente que o caso da Bienal do Rio, alvo de tentativa de censura por parte do prefeito Marcelo Crivella, incomodado que estava com publicações LGBT, teve mais espaço na edição desta segunda, até em função da larga repercussão obtida pelo episódio, com idas e vindas de liminares e intervenção do STF (Supremo Tribunal Federal). Mas Doria foi citado na lista de inaceitáveis manifestações de censura, com o que se convencionou chamar de “ideologia de gênero”, outro termo equivocado.
Oxalá essa independência tenha longo prazo de validade e possa ser renovada por futuros mandantes do cargo no Palácio do Governo.
Nesses dias em que o presidente da República ameaça veículos de imprensa diante de microfones e câmeras, à luz do dia, com a suspensão de verbas publicitárias federais, e seus aliados pedem cabeças de jornalistas críticos ao governo de Bolsonaro, ganha quem souber lidar com a liberdade de imprensa com responsabilidade e justiça.
A entrevista está disponível no canal do Roda Viva pelo YouTube e é bastante esclarecedora em vários aspectos. Como disse o entrevistado, apenas de três ou quatro perguntas difíceis de serem respondidas, ele não fugiu a nenhum questionamento.
Entre os pontos altos, disse que o presidente Jair Bolsonaro já incorreu em vários casos que poderiam lhe render um processo de impeachment, mas um rompimento nunca é algo bom para uma nação e enquanto houver governabilidade com o Congresso, isso não deve ser cogitado.
E disse que seguramente, no lugar de Sergio Moro (onde, aliás, ele de fato já esteve, no governo FHC), já teria pedido para sair do cargo, em razão da falta de autonomia que tem sido demonstrada em ações de intervenção do presidente no ministério da Justiça e em áreas que lhe cabem, em especial, a Polícia Federal.