Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

‘Um Lugar ao Sol’ é título que vem a calhar para reabertura pós-pandêmica

Imagem de Cauã Reymond duplicado nos gêmeos de 'Um Lugar ao Sol' / Reprodução

A volta de cenas inéditas à faixa que reúne a maior plateia do país é, por si só, um alento para a ideia de reabertura pós-pandêmica. Não que a pandemia tenha terminado ou esteja perto de dispensar os tantos cuidados que ainda nos são demandados, mas essa retomada, no ar, ao alcance do controle remoto, diz muita coisa.

Nesse contexto, não poderia haver título mais adequado a uma retomada do que “Um Lugar ao Sol”, folhetim que marca a estreia de Lícia Manzo na faixa das nove da Globo, a partir desta segunda-feira (8), sob direção-artística de Maurício Farias.

Em um ano e oito meses, a novela das nove teve uma breve pausa de reprises com a necessidade de finalizar a saga de dona Lurdes (Regina Casé) em busca de seu Domênico (Chay Suede) em “Amor de Mãe”, mas as perspectivas de retomada eram para lá de instáveis, e seguimos recorrendo ao baú de folhetins da última década.

Quando deixou o “BBB 20” e tomou real conhecimento das sanções impostas pela pandemia, em abril de 2020, Babu Santana disse que só se deu conta da dimensão da crise sanitária ao saber que a Globo havia interrompido suas novelas. É esse código que agora nos motiva a experimentar dias melhores ou, no mínimo, a imaginar que o pior já passou.

UM LUGAR AO SOL

No enredo que vem aí, Cauã Reymond se divide em três atuações: a de Christian, criado em abrigo em Goiânia até os 18 anos, por nunca ter sido adotado; a de Cristofer, irmão gêmeo de Christian, que há de se tornar Renato após ser adotado por uma família abastada do Rio; e a de Christian fingindo ser Renato, depois que o irmão rico é dado como morto.

A história do irmão gêmeo criado em um abrigo, longe dos recursos a que seu par teve direito,  encontra um ponto bem afinado com o filme de mesmo nome, “A Place in The Sun”, de George Stevens, quase como uma referência ao premiado título do cinema. Protagonizado por Montgomery Clift, o enredo é baseado no livro “Uma Tragédia Americana”.

Não é que Christian quisesse ver Renato morto, ou assim entenderemos essa história a princípio, mas as circunstâncias o levam a assumir o seu lugar para alcançar uma vida de conforto que ele nunca teve. Há aí um oportunismo que a autora pretende justificar como alguém que busca literalmente um lugar ao sol.

No caso do filme, George Eastman (Clift) até pensa em matar a namorada pobre, Alice (Shelley Winters)  para ficar com a rica Angela Vickers (Elizabeth Taylor), que se encanta por ele. A operária não aceita facilmente o fim do romance e revela estar grávida. Mas o rapaz nem precisa cometer o crime, vendo-a morrer por afogamento em um acidente de barco.

Quando apresentou a sinopse ao então diretor de teledramaturgia Silvio de Abreu, Lícia Manzo ouviu dele essa questão: vamos adotar o nome de um filme? Mas o próprio Abreu referendou cenas e novelas suas nos clássicos do cinema, inclusive no título, caso de “Belíssima”.

O oportunismo de Christian, que há de ocupar todos os espaços do irmão, inclusive a namorada, Bárbara (Alinne Moraes), livrando-se da namorada pobre, Lara (Andréia Horta) também encontra afinidade com “Match Point”, filme de Woody Allen de 2005, que por sua vez é referendado com várias citações de “Crime e Castigo”, de Dostoievski.

Christian (Cauã Reymond) e Lara (Andréia Horta)

No enredo do filme de Allen, o professor de tênis Jonathan Rhys Meyers conhece Chloe (Emily Mortimer), jovem de família rica, e inicia um namoro com ela. Pouco antes disso, no entanto, ele se apaixona por Nola (Scarlett Johansson), namorada do irmão de Chloe, com quem mantém um romance  paralelo. Interessado na fortuna da família de Chloe, Jonatham precisa se livrar de Nola, que fica grávida.

Como disse Lícia em entrevista a um grupo de jornalistas, todas as histórias já foram contadas. O que lhe interessa é a maneira de contá-las. “Eu não acredito em plot repetido, acredito em modo de contar”, afirmou a autora, que escreveu também “Sete Vidas” e “A Vida da Gente” para a faixa das 18h.

“Acho que a autoria vem primeiro que a história. Para mim, não importa a troca [dos gêmeos]. O que me interessa é a repercussão dos fatos dentro dos personagens, o jogo subjetivo. Estou muito mais interessada na camada psicológica e social que esse jogo me traz.”

A história nasceu mesmo foi do documentário “Meus 18 Anos”, que ela viu na Globonews e que apresenta personagens forçados a deixar o abrigo onde foram abandonados quando pequenos, sem jamais terem sido adotados. Apesar da ausência absoluta de perspectivas, os personagens daquele cenário saíam dali sonhando em ser médico, pedagogo e psicólogo, entre outros ofícios de formação acadêmica.

Ao buscar um par abastado para o rapaz que conduz essa história, no caso, Christian, Lícia Manzo traça o espelho da desigualdade, a imagem refletida do menino pobre no gêmeo problemático e riquinho.

No elenco estão ainda Marieta Severo, Andréa Beltrão, Denise Fraga, Regina Braga, José de Abreu, Gabriel Leone, Marco Ricca, Mariana Lima, Juan Paiva, Ana Beatriz Nogueira, Fernando Eiras, Pathy Dejesus, Daniel Dantas, Ana Baird, Danton Mello, Danilo Grangheia, Indira Nascimento, Lara Tremouroux, Otávio Muller e Cláudia Mauro, entre outros nomes.

“Um Lugar ao Sol” inaugura a parceria entre Lícia e o diretor Maurício Farias, ele também estreante no posto de direção-artística de novela, após anos dedicados a séries de humor como “A Grande Família”, “Tapas e Beijos”, “Tá no Ar” e “Filhos da Pátria”.

Lícia escreve com Leonardo Moreira e Rodrigo Castilho e colaboração de Carla Madeira, Cecília Giannetti, Dora Castellar e Marta Goés.

A direção geral é de André Câmara e direção de Vicente Barcellos, Clara Kutner, João Gomez, Pedro Freire e Maria Clara Abreu. A produção é de Andrea Kelly e a direção de gênero, de José Luiz Villamarim.

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