Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

‘Altas Horas’ é um oásis nesse mundo que produz mais ataques que argumentos

Não que eu tenha descoberto o “Altas Horas” nesta noite, mas a edição deste sábado acendeu de modo incontestável a percepção de que o programa do Serginho Groisman se tornou um oásis nesse mundo polarizado onde sobram ataques rasos e faltam argumentos a qualquer situação.

Fala-se em censura nas artes, haters da web, redes sociais, princesa Leopoldina, desigualdade social, política, conservadorismo, pedofilia e outras tretas, como dizem por aí. Um historiador de discurso atraente e vocabulário palatável defende suas respostas com argumentos capazes de abastecer o conhecimento de quem busca entender o que se passa no Brasil atual.

Lá pelas tantas, o apresentador ainda abre o microfone para a plateia presente, perguntando quem pensa diferente das ideias ali expostas. Sim, sempre tem alguém com ponderações, perguntas ou divergências a esclarecer. Que bom.

Civilidade atrai civilidade. É difícil imaginar que alguém, nessa atmosfera do “Altas Horas”, vá tomar o microfone para agredir alguém com ideias diferentes das suas. É exatamente o contrário do que acontece nas redes sociais e comentários abertos na web, onde ações de agressão geram reações dispostas a medirem força, e portanto ainda mais agressivas, transformando o ambiente virtual em um inferno de Dante – ou nem isso, já que “A Divina Comédia” ao menos tem poesia e métrica, com o mínimo de lógica e racionalidade.

No programa deste sábado, em meio aos argumentos de Leandro Karnal e à precisão de Caetano sobre censura à arte e falsas interpretações de pedofilia, encontramos os deliciosos refrões da banda Axé 90 Graus, coisa de tirar o espectador do sofá, além do repertório do próprio Caetano, acompanhado dos três filhos.

Entre uma pergunta e outra, reflexões profundas vêm à tona de uma forma que a TV comercial mal tolera, mas não é que aquela plateia de jovens não pisca um segundo e se mostra interessadíssima em cada abordagem ali exposta? Conspirando a favor desse interesse, Marco Luque prova que fez diferença ao ritmo do programa, entrando aqui e ali com personagens divertidos e sem a menor semelhança entre si. E ainda tem o papo sobre sexo com Laura Miller, um dos momentos mais aguardados, talvez até pela escassez que o tema encontra na própria TV.

O final é pura celebração, com Axé 90 Graus, Caetano e herdeiros ao som de “Tieta”, enquanto Letícia Colin arrasta Karnal para uma breve coreografia baiana.

Estamos em um canal aberto comercial, e não diante do “Café Filosófico”, da TV Cultura (que embora seja bacana, exibe um retrato pronto para atender apenas quem já tem conhecimento de sobra). Conduzido com maestria e delicadeza cirúrgica por Serginho, o “Altas Horas” dribla todas as premissas que fazem a televisão perseguir sempre o sucesso mais fácil de audiência, sem perder a massa de vista. O  programa endossa que é possível fazer um programa popular e útil ao repertório social, político e cultural de quem assiste, sem cair na chatice.

Inspirador.

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Cristina Padiglione

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