Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Ao fim do Todo Seu, convém uma confissão quase inconfessável

Com Ronnie Von, no já saudoso Todo Seu / Divulgação.

Pela primeira vez em quinze anos, excluindo aí algumas férias do titular, a semana começa sem o “Todo Seu”, programa que Ronnie Von apresentava na TV Gazeta. Tive o prazer de participar da cena nos dois últimos anos e meio, sempre mantendo o cardápio televisivo que aqui desfio. E gostava tanto de estar ali, que ouso confessar o inconfessável: ainda me pagavam para tanto, e pagavam em dia, sem uma só falha, um só centavo a menos, com renovação de valores em dia, honrando um contrato que desde a minuta não mereceu da contratada uma só contestação.

Costumava dizer que o expediente na TV torna mais ingrato o trabalho de quem escreve porque não lhe cobra rigor com hífens, vírgulas, negritos ou itálicos, parágrafos e que tais, sem falar que o reconhecimento público é inevitavelmente maior, dado o alcance da tela. A missão torna-se ainda mais feliz quando se tem um interlocutor sempre pronto a lhe paparicar e uma equipe de make up que faz milagres no seu lay-out, quase sempre driblando uma colunista pouco pontual, como é o meu caso, patológico.

Nosso Príncipe era quase uma instituição da tradicional emissora criadora de talentos na TV.

A Gazeta, além de morar no meu coração pelo afeto que representa no histórico da minha vida (da faculdade ao casamento com meu muso e dois lindos filhos a seguir) é um celeiro de talentos.

Não houve uma só vez em que eu adentrasse a chamada Sala VIP, para onde os convidados eram encaminhados antes de chegarem à maquiagem, que eu não me demorasse admirando imagens de Serginho Groisman, Astrid Fontenelle, Fausto Silva, Roberto Avallone, Chico Lang, Flávio Prado, Clodovil, Ione Borges, Claudete Troiano, Rogério Gallo, Tadeu Jungle, Cris Lobo, Hugo Prata e tantos outros, todos novinhos de tudo, na flor da idade.

Peço perdão pelo tom pessoal deste post. É algo que contraria um dos princípios básicos da profissão: o jornalista nunca deve ser parte da notícia. Neste caso, no entanto, deem-me licença para desobedecer a regra.

Demorei a processar a notícia do fim do programa, que soube, por meio da amiga Patricia Villalba, graças à notícia antecipada pelo amado mestre Flávio Ricco, mais uma vez. Como digo, Flaviano, como o chamo, tem participação no RH de todos os canais de TV, sempre antecipando quem chega e quem sai, furando esta sua discípula mesmo quando ela é parte do contrato encerrado.

Sempre gostei do Príncipe, mas uma das ciladas de se conhecer gente querida com mais proximidade é o grande risco de descobrir-lhe os defeitos e perder o encanto que antes nos seduzia naquela figura. A curta distância de Ronnie Von, no entanto, só recarregou as baterias de todo afeto que eu já sentia por ele. Generoso, bem-humorado e leve, nunca o vi perder a elegância e o savoir d’affaire. Mesmo quando demonstrava uma nesga de crítica ao que quer que fosse, fazia-a com uma elegância que não se aprende nem se ensina: ou se nasce com ela ou só se adquire nascendo de novo.

Ali cheguei com certa empáfia de quem desembarca de anos e anos moldados no rigor dos jornais impressos, algo quase em extinção hoje. De pouco em pouco, fui desconstruindo parte da guarda de quem associava serenidade a alguma sisudez, mesmo analisando e criticando esse fator do outro lado da tela por tantos anos.

Só posso dizer que fui bem feliz nesse meu honroso trecho do currículo.

Vou sentir saudade.

Da Gazeta.

Da Paulista, 900, meu endereço de longo afeto.

Das melhores mostras de gastronomia dos melhores chefs, que eu garfava sem pedir licença, sob o ônus de às vezes traçar a sobremesa do boss, sempre príncipe.

E do Ronnie, sobretudo, que todo dia me ensinava a ser mais afável, por mais amarga que fosse a cena a comentar.

Bonitinho.

Oxalá logo possamos vê-lo de novo em outra tela.

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Cristina Padiglione

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