Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Band leva Fogaça ao paredão por piada com viés religioso

A cena da controvérsia. Foto: Instagram

A temporada de caça às bruxas está aberta.

Alvo de grande gritaria por parte de religiosos, a Band resolveu abrir uma espécie de sindicância contra uma de suas maiores estrelas, o chef Henrique Fogaça, jurado do Masterchef Brasil.

Fogaça cometeu o “crime” de brincar com uma imagem: vestindo uma camiseta onde duas mulheres trajando hábito de freiras se beijavam na boca, ele posou com duas freiras de verdade, brasileiras, na vizinhança do Vaticano, em Roma, com uma legenda que repudiava a hipocrisia.

Notando que ofendeu muita gente, Fogaça voltou ao local onde a foto foi publicada, seu perfil no Instagram, e pediu desculpas pela brincadeira, apagando a imagem. No dia seguinte, reforçou o pedido de desculpas com um vídeo, contando inclusive que foram as freiras que pediram para fazer a foto com ele, mas, sobretudo, repudiando qualquer intenção de desrespeitar quem quer que fosse e suas crenças.

Tudo parecia mais calmo, quando a Band, nesta quarta, resolveu distribuir um comunicado para dizer que não compartilha da brincadeira de Fogaça e que está “analisando a situação”. Além de parecer atrasada na manifestação, a Band poderia deixar que o próprio Fogaça resolvesse a confusão em que se meteu, mesmo porque, como o próprio comunicado da emissora diz, isso não aconteceu em seu horário de expediente, ou seja, em qualquer circunstância relacionada ao seu trabalho pelo Masterchef.

O cuidado da Band em provar que nada tem a ver com o fato equivaleria a se manifestar no caso dos vários processos trabalhistas enfrentados por Erick Jacquin em razão de seus antigos restaurantes. Não cabe à emissora tratar dos casos de assédio moral de que Jacquin foi acusado, como não cabe agora tentar se eximir de uma cena que é exclusivamente de responsabilidade do chef. Ele estava em Roma a passeio, longe do seu horário de trabalho e das câmeras da emissora. E, até onde se viu, mostrou-se disposto a resolver o assunto antes mesmo de ser advertido pela maior contratante de sua imagem.

Diz o comunicado:

“O Grupo Bandeirantes tomou conhecimento das declarações proferidas pelo chef Henrique Fogaça nas redes sociais.

Referidas declarações, feitas no âmbito das redes sociais do chef, não expressam, de forma alguma, a posição da Band, que se pauta no respeito às crenças e sem preconceitos em relação aos credos, etnias, sexos, raças, vertentes políticas e ideológicas.

Ainda que referidas manifestações tenham ocorrido fora da programação e no âmbito da vida pessoal do chef Henrique Fogaça, a Band irá analisar o caso, com profundidade, depois de ouvi-lo.”

A decisão da Band é muito sintomática dos chamados novos tempos, em que toda empresa deve zelar e punir seus contratados exemplarmente, com pitos públicos por ações nem sempre cometidas no exercício de seus trabalhos.

Não é, nem pode ser, uma atitude exclusivamente relacionada aos atos. Ou então, como explicar o longo silêncio da emissora sobre o caso Wanessa Camargo x Rafinha Bastos no CQC, há coisa de poucos anos? Na época, a ausência de um posicionamento da casa, e estávamos falando de uma cena que foi ao ar, em pleno expediente do contratado, permitiu todo tipo de especulação por redes sociais e imprensa.

Agir com responsabilidade para frear casos de preconceito e intolerância de toda espécie é muito bacana, mas deve ser, antes de mais nada, produtivo para a causa. Nesse caso, ao que consta, o protagonista do equívoco já havia dado sinais de quem tentava corrigir um reconhecido erro. De todo modo, se a questão é o veto a qualquer brincadeira com viés religioso, podemos enterrar metade dos esquetes do Zorra, do Porta dos Fundos e do Monty Python.

O que diríamos então a Oliviero Toscani, publicitário da Benetton, que nos anos 1990 produziu uma campanha em que uma freira beijava um padre. Questionado em uma entrevista no Roda Viva por que não promoveu a imagem de um padre beijando outro padre, o polêmico italiano respondeu: “porque isso seria normal, seria um clichê”.

 

 

 

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Cristina Padiglione

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