Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

‘Bom Sucesso’ prova que é possível unir audiência e repertório

Paloma (Grazi Massafera) e Alberto (Antonio Fagundes) em cena na novela 'Bom Sucesso' / Reprodução

Há caminhos muito fáceis para as grandes bilheterias. Difícil é conquistar audiência sem recorrer a frases de efeito ou soluções de assimilação imediata pelo cérebro de quem consome a informação. Nelson Rodrigues dizia que o canastrão chega mais rápido ao coração do público. É verdade. De modo que se torna uma tarefa mais árdua elaborar todo um pensamento e uma narrativa que contenha repertório útil (e quando digo útil, quero dizer não-descartável ou raso, que vá sumir da mente do espectador dali a dois dias: repertório útil tem estofo para acrescentar algo ao conhecimento da plateia).

De Rosane Svartman e Paulo Halm, sob direção de Luiz Henrique Rios, “Bom Sucesso” trouxe vários elementos úteis e as menções literárias foram seu ponto máximo, mas não único.

Houve a questão inter-racial, com negros e brancos em feliz convivência, romances e conflitos dramáticos nas relações humanas, e houve diálogo entre as chamadas bolhas, sem resvalar em questões partidárias, algo quase impossível na vida real e, mais ainda, das redes sociais.  O caminho da moça popularesca do samba, batalhadora da periferia, se cruza com o do intelectual cheio de empáfia que não se permitia “descer” ao nível do que ele antes tratava como vulgar.

Um homem com uma sentença de morte tem tempo de revisar seus valores e modos de expressar seu afeto, para, enfim, fazer as pazes com sua existência e partir deste plano.

Para que o encontro fosse frutífero, claro, ela já era alguém altamente interessada em literatura. Citam Rubem Braga, Monteiro Lobato, Jorge Luiz Borges, Miguel de Cervantes, Mario de Andrade, Drummond, Charles Baudelaire e tantos outros, sem flertar com o tom panfletário.

Antonio Fagundes e Grazi Massafera fizeram um dueto impecável, sobre o qual pairavam dúvidas até a novela entrar no ar, algo imediatamente desfeito desde o primeiro encontro entre os dois.

E já que quanto mais malvado é o vilão, maior é a força dos mocinhos, viva Armando Babaioff. E viva Lucinho Mauro, Fabíula Nascimento, Davi Júnior e Rômulo Estrela, sem que isso signifique desmerecer qualquer outro nome do elenco.

Se os autores merecem nosso mais profundo respeito pela obra executada, convém lembrar que o diretor sai dessa como grande maestro de uma orquestra onde todo mundo deu o seu melhor e funcionou bem.

Os números responderam com a melhor audiência do horário desde “Cheias de Charme”, de Filipe Miguez e Izabel de Oliveira (2012), chegando a superar a novela das nove em sua reta final.

Oxalá “Bom Sucesso” sirva de modelo para inspirar autores mais propensos a buscar audiência fácil, e a própria Globo, quando se rende a fórmulas chavão apenas em busca de números.

O que importa, como disse Alberto (Fagundes) em seus últimos ensinamentos, é que “a Terra é redonda”, um lembrete que já se achava assimilado até pouco tempo atrás, agora tratado como notícia.

 

Obs. Em tempo: Ao chamar o personagem de Lucinho Mauro de “Mario Viana”, os autores homenagearam um de seus colaboradores na novela anterior, “Totalmente Demais”, que não pode estar presente na equipe de “Bom Sucesso” em razão de outros compromissos assumidos. 

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Cristina Padiglione

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