Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Comédia de Porchat escancara universo masculino para elas e gera identificação neles

Porchat entre Raphael Logam, Gabriel Louchard e Gabriel Godoy / Divulgação

“Homens?”, comédia de Fábio Porchat que estreou no canal Comedy Central nesta segunda, coloca as telespectadoras nas tão sonhadas rodas masculinas, entre conversas que normalmente eles alteram quando uma menina chega ao grupo.

Yes, podemos conhecer um pouco do tom, dos detalhes e dos ângulos que eles falam sobre elas.

Mas será que realmente eles falam tudo aquilo? Boa parte dos homens que se juntam em pequenos grupos não tem coragem de se expor a outros homens, mesmo que poucos, da forma como os amigos de “Homens?” o fazem. Daí o aspecto libertador que essa conversa deve ter até mais para meninos do que meninas.

Isso porque o papo gira em torno de brochar e por que brochar ou não brochar. Não falam sobre futebol, evidentemente, assunto que seria muito mais palatável a qualquer grupo masculino, mas falam de suas fraquezas, muitas vezes sem ter noção do quão frágeis são suas confissões.

Falando assim, parece até que estamos numa D.R. de consultório psiquiátrico, mas não. Estamos no campo do humor. Fazer rir é coisa séria, quanto mais séria for a capacidade de incomodar a plateia, melhor a piada.

“Homens?” incomoda meninos e meninas da melhor forma: fazendo rir. Nessa condição, baixamos a guarda e involuntariamente permitimos que aquela conversinha toda nos afete.

Os diálogos são feitos para isso. Só incomoda um pouco, mas reconheço ser exceção à regra vigente para grandes plateias, que todo mundo tenha frases construídas com começo, meio e fim, argumentando cada palavra. As séries americanas têm muito disso. Todo mundo fala com lógica, raciocínio linear e conclusão, o que irrita um pouco quem procura se encontrar em cada diálogo em cena.

Somos titubeantes, gaguejamos, buscamos palavras até encontrar as mais adequadas, quando as encontramos. Esse blábláblá com tudo no lugar afasta o espectador da magia gerada pela identificação ou fascínio com o personagem, rompendo bruscamente a sua imaginação. É quando tudo se desmonta e você lembra que está diante de uma ficção, o que não é ruim, mas, para usar um termo em torno do qual o enredo gira, dá uma brochada.

Quando Gabriel Godoy trepa de meias e a moça pede que ele as tire, isso, sim, tem um vaivém próximo da vida real, e por isso é bacana, como coisas que não se resolvem em duas frases. Mas quando a prostituta termina a noite com textinho todo emoldurado para os rapazes perdidos nesse universo de empoderamento feminino, a tendência é desembarcar da imaginação que nos levou até ali e lembrar que estamos diante de um roteiro cuidadosamente produzido.
Em suma, falta uma pitada de desconstrução de alguns pensamentos. Falta descabelar mais o penteado cuidadosamente feito.
Por outro lado, convém reconhecer que as frases que chegam a ser tão bem construídas que se tornam pouco críveis, muitas vezes inspiram no espectador o desejo do quão eloquente ele, espectador, gostaria de ser. É quando você vê o sujeito falando tão bem e tão perfeitamente tudo aquilo que você gostaria de falar sem ter de elaborar um texto na sua cabeça, que o personagem causa uma inveja inspiradora no espectador.

De um modo ou de outro, é fascinante embarcar nas piadinhas de mau gosto dos homens no ambiente corporativo, assim que as colegas lhes viram as costas. Melhor é rir.

Merecem aplausos a edição e a montagem, tudo no lugar, sem arestas, como num filme que percorre nossos pensamentos sem cortes abruptos. O quarteto de atores (mais o pênis, Rafael Portugal) tem química e faz o público acreditar numa rara amizade masculina que se permite confessar e debater sobre as falhas do pênis alheio.
O texto é ótimo e o ritmo, idem.
Aliás, uma segunda falha a ser apontada é essa: o episódio é muito curto. Deu vontade de ver mais.

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Cristina Padiglione

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