Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Contra aqueles que querem ‘passar a boiada’, vilão de ‘Aruanas’ recoloca Amazônia em foco

Luiz Carlos vasconcellos vive Miguel em 'Araunas': 'boa coincidência com momento atual'/Divulgação

“Veja como a vida é”, diz, com um sorriso de rasgar o rosto, o doce Luiz Carlos Vasconcellos, vilão na minissérie “Aruanas”, que chega nesta terça-feira (26) à metade. “Estamos vivendo esse momento terrível, é incrível o desmatamento, esses grileiros, esses invasores estão entrando, estão querendo diminuir a fiscalização, mas a vida vem com ‘Aruanas’ neste momento. O governo que está com esse desmonte vê chegar à TV de maior audiência dez episódios de uma série como esta. É um assunto que estava fora das manchetes”, completa.

E olhe que a frase de Vasconcellos foi dita antes que conhecêssemos o teor do vídeo que registrou a reunião ministerial de 22 de abril passado, quando o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que o governo Bolsonaro deveria aproveitar este momento de “tranquilidade” em que a imprensa está com foco na crise sanitária, agora com espaço disputado pelo seu chefe com a crise econômica e política, para “passar a boiada” e aprovar regulamentações normalmente muito vigiadas pela mídia e pelo judiciário.

A declaração de Salles só fez aumentar o espaço que o desmatamento e políticas do setor ambiental voltaram a ter no noticiário. Quando Vasconcellos falou sobre o assunto, em videoconferência promovida pela assessoria de comunicação da Globo, ao lado de Camila Pitanga, vilã como ele na série, o assunto ainda era a derrubada do PL da Grilagem, que acabou substituído por uma MP de outra denominação, igualmente empatada no Congresso.

Para o azar de Salles e lobistas ambientais, papel que aliás cabe a Camila Pitanga na série, é bem nesta terça-feira (26), quando a primeira temporada do realista enredo de Estela Renner e Marcos Nisti chega à metade na Globo, que vai ao ar o episódio em que as ativistas vividas por Leandra Leal, Taís Araújo, Débora Falabella e Thainá Duarte descobrem o garimpo ilegal dentro de terras indígenas, com cenas de massacre. Para a falta de sorte de Salles, ainda no domingo passado, dois dias atrás, o Fantástico exibiu números assustadores de desmatamento fornecidos pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

“No meio de uma pandemia, colocar na pauta um projeto de lei que regulamenta a grilagem de terra vai institucionalizar, formalizar isso como uma prática: é inaceitável esse oportunismo”, endossa Camila. “‘Aruanas’ ajuda, colabora em abrir o olhar para a gente não ficar anestesiado e deixar isso passar”.

“A gente está entrando no coração da Amazônia, a gente está falando de uma especulação imobiliária”, completa. Vasconcellos emenda: “É um genocídio o que está acontecendo. Miguel materializa a força maior que governa este país hoje, basta um olhar superficial sobre o que está acontecendo”.

Com uma segunda temporada já em gravação, “Aruanas” esteve antes disponível só para assinantes da plataforma GloboPlay. A série chegou quando as queimadas e o desmatamento estavam no olho do furacão, no ano passado, e foi relevante ver o título disponível para mais de 120 países por meio da plataforma VIMEO. A produção foi exibida para grupos que militam pela causa ambiental no mundo todo, em um momento em que os olhos do planeta estavam voltados para a Amazônia.

A frase mais vista em todas as chamadas da série está justamente na boca de Miguel, o minerador vivido por Vasconcellos: “Quem gosta de floresta é índio. Povo gosta é de dinheiro e dinheiro não vai faltar”. Na história, a mineradora compromete não apenas o desmanche da floresta e as terras indígenas, mas também a vida da população local, contaminada pela água dos rios em razão da produção de minérios.

E quando ao espectador parecer exagerada a ação das militantes que protagonizam a série, pense só na frase de Salles, disposto a passar a boiada, como a se aproveitar da distração da imprensa diante de milhares de mortos pela Covid-19.

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