Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Direito autoral é assunto da maior urgência em congresso internacional no Rio

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Apontado como segundo maior mercado de assinantes da Netflix no mundo, apenas atrás dos Estados Undios, o Brasil é um país francamente atrasado no que diz respeito à remuneração de direitos autorais de seus roteiristas e diretores. As empresas de streaming, de modo geral, aproveitam bem a farta clientela obcecada por vídeos vigente por aqui, mas não paga os autores locais sob os mesmos critérios que já regem esee mercado em países como Espanha, França, Chile, Colômbia e Argentina.

Esse é o ponto central do congresso mundial da Confederação Internacional de Autores Audiovisuais, a AVACI (em Inglês, Audiovisual Authors Internacional Confederation), que vai desta terça, 2 de maio, até o dia 5, no Rio de Janeiro, reunindo diretores e roteiristas do audiovisual de pelo menos 50 países.

É a primeira vez que o evento internacional dessa entidade ocorre no Brasil e em parceria com a DBCA (Diretores Brasileiros de Cinema e do Audiovisual) e a Gedar (Gestão de Direitos de Autores Roteiristas), as duas sociedades de gestão de direitos de autores diretores e roteiristas habilitadas no Brasil.

O congresso tem ainda o apoio de sociedades de gestão de direitos autorais parceiras da Argentina, Chile, Uruguai, Colômbia e México. Participam das discussões cineastas, roteiristas, gestores de direitos autorais e advogados especialistas em direitos autorais dos cinco continentes.

O encontro será no Hotel Sheraton, restrito às diretorias e associados observadores das entidades, mas terá mesa de abertura dia 3 de maio, uarta, às 9h30, transmitida ao vivo pelo Youtube da Avaci, pelo seguinte link: https://youtube.com/@avaci-avauthors9882

Para a abertura são esperadas as presenças da diretora de Sociedades de Gestão Coletiva e Direitos Autorais do Ministério da Cultura, Marissol Pinheiro, além do Coordenador do Conselho Executivo da Avaci e diretor da DAC (Diretores Argentinos Cinematográficos), Horácio Maldonado, do presidente da DBCA, o cineasta e advogado Henrique de Freitas Lima, e do roteirista presidente da Gedar, Thiago Dottori, além de outros importantes representantes das categorias de diretores e roteiristas no Brasil e no mundo.

A mesa discutirá a importância do reconhecimento do direito de remuneração pela exibição pública de obras para o desenvolvimento da indústria audiovisual e seus benefícios sociais em países que já dão essas garantias legais aos autores audiovisuais.

Assim como existe o direito à remuneração na Argentina, Uruguai, Chile, Panamá, Colômbia, México, tanto para roteiristas quanto para diretores, é preciso que um país tão importante como o Brasil, que é um autêntico e verdadeiro poder audiovisual, reconheça o direito que esses autores têm de receber uma compensação justa por suas obras audiovisuais que são divulgadas publicamente por todos os meios de comunicação existentes hoje, não apenas em seu país de origem, mas em todo o mundo”, afirma Horácio Maldonado, coordenador do Conselho Executivo da Avaci e diretor da DAC (Diretores Argentinos Cinematográficos).

“Esse reconhecimento na Argentina trouxe uma melhoria transcendental para todas as pessoas que se dedicam a esta profissão. Foi gerada uma rede de ação social, atualização profissional por meio de seminários, possibilidade de empréstimos, mas acima de tudo, a dignidade de saber que esse direito acompanha o sucesso comercial da obra audiovisual criada”, completa Madonado.

Presidente da Gedar, o roteirista Thiago Dottori lembra que “nos países que reconhecem o direito à remuneração, os recursos gerados foram fundamentais, por exemplo, para socorrer profissionais durante a pandemia de Covid-19”. “Além desse valor social”, continua, “diferentes estudos apontam que a remuneração pela comunicação pública das obras é muito benéfica do ponto de vista econômico, de valor agregado, para o desenvolvimento da indústria audiovisual como um todo.”

Fundador e secretário-geral da DBCA, Sylvio Back observa que “há mais de 40 anos os autores do audiovisual brasileiro buscam equiparação aos seus colegas músicos”. Os atores também buscam essa equiparação, ainda em vão. A reivindicação pede que, assim como acontece com a música, cada vez que uma obra ou ator tem sua imagem revisitada em veículos que faturam com o produto, seus autores e atores sejam remunerados por isso, com percentual do cachê acordado por ocasião do contrato original.

A atriz Sônia Braga, por exemplo, perdeu ação que moveu na Justiça contra a Globo reprise de “Dancin’Days”, de 1979, no canal Viva. Embora o grupo Globo sempre sustente que paga todos os direitos de imagem e autorais devidos, o Viva não existia na época da produção, e portanto a veiculação da obra não era prevista nos contratos da ocasião com autores e atores.

O mesmo, no entanto, não ocorre com os direitos musicais, que são protegidos por legislação própria via Ecad. Não é à toa que esse quesito sempre é o fator que mais dificulta as decisões da Globo na hora de definir as produções a serem reprisadas no canal pago e no seu serviço de streaming.

“Durante a pandemia, esta realidade se tornou ainda mais evidente quando muitos criadores precisaram do auxílio financeiro oferecido pelo governo para sobreviver, enquanto canais e plataformas lucravam com a exibição de suas criações e não pagavam nada por isso, conclui Back.

“As sociedades de gestão esperam que com a retomada dos investimentos e das políticas para o audiovisual pelo Estado brasileiro e da interlocução com o Executivo, também o Congresso se sensibilize para este desequilíbrio em nosso mercado audiovisual, setor que gera mais recursos ao País do que a indústria farmacêutica”, diz o presidente da DBCA, Henrique de Freitas Lima.

Além de Maldonado, Freitas Lima e Dottori, também estarão no congressos Klemen Dvornik, diretor e roteirista que é presidente da AIPA, organização eslovena de direitos autorais; Yoon Jung Lee, diretora e roteirista que é vice-presidente da DGK, que representa diretores coreanos; Anjum Rajabali, roteirista que é presidente da SRAI (Roteiristas Audiovisuais da Índia); Laza Razanajatovo, diretor e roteirista que é presidente da APASER (Aliança Pan-africana de Roteiristas e Diretores), entre outras renomadas grifes do mercado mundial.

O que é o direito à remuneração pela comunicação pública da obra

É o direito do(a) autor(a) da obra audiovisual ser remunerado(a) pelas diversas exibições da sua obra. Cada exibição na TV aberta ou canais fechados, no cinema ou no streaming, por exemplo, deveria render ao autor da obra uma remuneração adicional ao pagamento fixo recebido no momento da contratação. E essa remuneração corresponde ao sucesso da obra. O reconhecimento desse direito já ocorre em países como Espanha, França, Chile, Colômbia e Argentina, mas não no Brasil.

Nos Estados Unidos, os roteiristas contam com um sindicato forte na categoria, o WGA (Wrieters Guild Association), que já teve grandes conquistas após ameaçar paralisar Hollywood e as empresas de streaming com greves, recurso que segue funcionando para atualizar os direitos de remuneração de seus criadores. Mas as empresas de streaming seguem fazendo no Brasil o que não ousam praticar por lá.

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