Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Em merchan social, Globo leva Prêmio Educador Nota 10 para dentro de ‘Malhação’

Carmo Dalla Vecchia, Andréa Beltrão, Camila Morgado e Otaviano Costa nos bastidores da premiação. Foto: Gustavo Scatena/Divulgação

Numa iniciativa muito útil de crossmedia, se assim podemos chamar, a Globo levou uma grande premiação da área de educação para dentro de “Malhação”. Nesta segunda-feira, durante o anúncio e entrega do Prêmio Educador Nota 10, na Sala São Paulo, Carmo Dalla Vecchia e Camila Morgado entregaram o troféu ao maior Educador do Ano. Em cena que vai ao ar na novela teen  entre os dias 12 e 15 de outubro, em tributo ao Dia do Professor, o casal foi chamado ao palco pelos nomes de seus personagens, Gabriela e Rafael, anunciados pelos apresentadores do evento, Otaviano Costa e Sandra Annenberg.

A personagem se permitiu ceder breve espaço à atriz quando Camila, após falar o texto da ficção, ouviu um “Ele não!” vindo do meio do público. Ela então respirou e repetiu: “Ele não, ele nunca”. Foi ovacionada. O termo, que naturalmente não estará na edição da novela, é referência à campanha que rejeita o voto no candidato à presidência do PSL, Jair Bolsonaro, e já havia aparecido ao longo da premiação, no microfone e no coro do público.

Levar o Educador Nota Dez à ficção é ação que certamente valoriza a premiação de uma forma muito bacana, à medida que lhe abre espaço em um programa de entretenimento. É o que se chama de merchandising social, dando ao prêmio uma vitrine que ele não teria se fosse ao ar apenas pelo canal Futura ou em programas reservados a temas educativos. Ao mesmo tempo, é um contrassenso tratar como algo nichado um assunto que diz respeito a todos e merece prioridade no debate nacional.

Realizado pela Fundação Victor Civita, com apoio da Abril e da Globo, em parceria com a Fundação Roberto Marinho, o Educador Nota 10 está em sua 21ª edição e envolve educadores de todo o país. Professores e gestores inscrevem seus projetos e, de uma grande peneira, apenas dez candidatos são selecionados para a cerimônia de premiação, sendo contemplados com 15 mil reais cada um e 1 mil reais para a instituição de ensino que o abriga. O vencedor final leva mais 15 mil reais e sua instituição de ensino, mais 5 mil reais.

Este ano, o Educador Nota 10 teve seus dez finalistas também apresentados no “Encontro” e no “Altas Horas”, reforçando a vitrine da premiação.

Abrindo a noite, Andréa Beltrão leu uma carta comovente escrita por Albert Camus, escritor, filósofo, ensaísta e jornalista francês, ao seu professor de infância, Louis Germain, poucos dias depois de vencer o Prêmio Nobel de Literatura, em 1957, quando já tinha 44 anos. Nascido na Argélia, Camus perdeu o pai para a guerra quando tinha apenas 1 ano. Aos 9, quis deixar os estudos para ajudar a mãe a sustentar a casa. Só foi adiante na escola por insistência do professor Germain, que enxergou nele um potencial extraordinário (leia abaixo a íntegra da carta).

“Eu tenho uma relação enorme com esse assunto, de educação”, contou Andréa ao TelePadi. “Tenho três filhos, mais um meio filho que  estudaram em escola pública. Eu também estudei em escola pública a vida toda e a minha mãe é professora de escola pública a vida toda. Fui convidada para estar aqui e quando me chamaram, eu lembrei dessa carta. O Camus é uma paixão antiga minha e essa carta é muito linda”, completa.

Para Carmo Dalla Vecchia, viver um professor lhe traz de volta a memória dos grandes professores que marcaram sua vida. “São pessoas inesquecíveis, que me tocaram profundamente e esse personagem me trouxe a lembrança da importância dessas pessoas que foram formadoras na minha vida e do quanto a energia delas foi extremamente importante para mim”, diz. “Como a TV é um veículo de massa, é mais fácil levar esse recadinho para o coração das pessoas, ainda mais em um programa de entretenimento e da forma como está sendo conduzido, acho que é de fácil absorção.”

Fruto de uma família cheia de professores, Otaviano celebrou a chance de apresentar o prêmio pela primeira vez e de levar o assunto ao grande público por meio de um produto de maior alcance. “Nós estamos codificando uma série de linguagens para que os recados caibam nesse universo digital.”

Camila Morgado lembra com afeto do encontro que teve com vários educadores, todos com histórias de transformação na vida de alunos, pouco antes de iniciar esta temporada de “Malhação”. “São professores que transformam a vida desses alunos, quase como uma forma de altruísmo. Isso me deu uma plenitude maior”, conta. Bom também é que sua Gabriela seja professora de Literatura, o que lhe dá a chance de explorar o papel com uma “visão mais “lúdico” e de se comunicar tanto com o adolescente, grande público da novela teen, como com o professor – e muitos deles retribuem com dicas, elogios ou críticas.

“Escuto muito os adolescentes, acho que ali tem um espaço dessa geração, molecada de 12, 13, 14 anos que assistem mesmo e se enxergam ali, isso é legal, e dos professores também. Eles estão muito felizes de serem representados”, fala a atriz.

Em tempo: o grande premiado da noite foi José Marcos Couto Júnior, com o projeto “As Caravanas, Limites da Visibilidade”. Professor de História na Escola Municipal Áttila Nunes, em Realengo, ele usou a música homônima de Chico Buarque para trabalhar a inserção do negro na sociedade e a ideia de invisibilidade social. A iniciativa teve dois grandes objetivos: ampliar o mundo dos alunos do 8º e 9º anos, levando-os a conhecer outros territórios e culturas, e contribuir para que desenvolvessem a escrita e a autoestima antes de ingressar no Ensino Médio.

Carmo e Camila entre os 10 finalistas, na Sala São Paulo. José Marcos, o vencedor, é o terceiro (de barba) da direita para a esquerda na foto. Crédito: Gustavo Scatena/Divulgação

A carta de Albert Camus ao professor, Sr. Louis Germain

19 de novembro de 1957

Caro Sr. Germain,

“(…) Acabo de receber uma grande honra que não busquei, que não solicitei, mas quando eu soube da notícia, meu primeiro pensamento, depois de minha mãe, foi para você. Sem você, sem aquela mão afetuosa que você estendeu ao menino pobre que eu era, sem seu ensino, sem seu exemplo, nada disso teria acontecido. Eu não faço questão dessa espécie de honra, mas essa é, ao menos, uma oportunidade para dizer o que você foi e sempre será para mim. E para assegurar-lhe que os seus esforços, o seu trabalho, e o coração generoso que coloca em tudo o que faz continuam vivos em seu pequeno discípulo,  não obstante à idade, não deixou jamais de ser seu aluno agradecido.

Professor , eu o abraço com todas as minhas forças. 

Albert Camus”

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Cristina Padiglione

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