Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Emílio Dantas pediu bênção a Paulo José para fazer ‘Todas as Mulheres do Mundo’

Emílio Dantas é Paulo, e Sophie Charlotte, Maria Alice, em "Todas as Mulheres do Mundo" / Divulgação

Nem o autor, Jorge Furtado, nem a diretora artística, Patrícia Pedrosa, viram Emílio Dantas se materializar diante do personagem Paulo, protagonista da série “Todas as Mulheres do Mundo”, um tributo à obra de Domingos de Oliveira, morto no ano passado. Foi o diretor de núcleo de teledramaturgia da Globo, Silvio de Abreu, quem sugeriu a escalação do ator, que Furtado e Pedrosa nem conheciam na ocasião, confessam.

Quando se vê o primeiro episódio da série, um produto exclusivo do GloboPlay que ganha degustação grátis na Globo aberta, na noite desta quinta-feira (23), nota-se que não haveria ninguém mais perfeito para vestir esse arquiteto passional, morador de um apartamento charmoso em Copacabana.

Primeiro longa-metragem do dramaturgo, em 1966, “Todas as Mulheres do Mundo” foi título feito com Paulo José e Leila Diniz, figura que agora, pode-se dizer, se transfere para Sophie Charlotte, considerada a musa de Domingos.

“Antes de gravar, fui até a casa do Paulo José, e percebi que o Paulo [personagem] é ele mesmo”, contou Dantas em uma videocoletiva, modalidade desses tempos de coronavírus. Ator, diretor e escritor que pautou sua trajetória pela sedução e bom repertório, Paulo José, 83 anos, foi casado com Dina Sfat e Zezé Polessa, mas fez mais que uma geração se curvar ao seu charme, à sua voz e discurso. O filme original, para quem tiver interesse, pode ser alugado pelo Canal Brasil.

Paulo José no filme original, de 1966

Ao visitar o ator da produção original, Dantas não fugiu à regra e, bingo, encantou-se por Paulo José, confinado em sua casa, um refúgio com vista para a Pedra da Gávea, no Rio, cercada por pôsteres de filmes como “Macunaíma”, que ele protagonizou com Grande Otello, estantes e prateleiras de livros a perder de vista, e outro tanto de rabiscos, molduras e quadros. É um cenário que poderia perfeitamente ser a casa desse personagem do filme agora revisitado em série, com novos textos, bilhetes, e-mails e percepções do doce Domingos.

Nome que se consagrou como Rubinho, par de Juliana Paes na novela “A Força do Querer” (2017) , encarnando depois o ídolo fictício baiano Beto Falcão no folhetim “Segundo Sol” (2018), Dantas traz da vida real o timbre comovido do personagem e, por consequência, de seu criador. As obras de Domingos primam pelos diálogos, não pela pirotecnia, ao contrário. A diretora, que buscou quase um tom preto-e-branco nas cenas, com poucas cores nas paletas de cada enquadramento, compreende perfeitamente a grandeza do texto para não ofuscar-lhe o protagonismo.

E Paulo é o entusiasmo que Dantas transborda no relato de seu contato com o universo de Domingos, coisa que Sophie Charlotte já conhecia melhor. “De tanto ver o filme e aqueles diálogos, eu repetia os textos para pessoas e amigos a quem eu queria mostrar a obra dele, eu sabia muita coisa na ponta da língua”, ela nos conta.

Paulo José inspirou Dantas a desdobrar seu apaixonado arquiteto, alguém que se relaciona com uma mulher diferente a cada episódio, tendo Maria Alice, figura de Sophie, que foi Leila há 54 anos, como referência.

A série é uma ideia de Domingos com Maria Ribeiro, que também entra em cena agora. A iniciativa começou a ganhar forma dois anos antes da morte do dramaturgo, quando Maria foi até Furtado e lhe apresentou a ideia. A textos do dramaturgo, já conhecidos de peças e filmes, incluindo o próprio “Todas as mulheres do Mundo”, Furtado acrescentou poemas, histórias e relatos inéditos do escritor.

Nesses tempos de pandemia, de isolamento social, de não-abraço, de bateção de panelas e polarização de toda espécie, acredite: é um conforto ver personagens se entregando a visões tão passionais da vida.

Matheus Nachtergaele faz Cabral, o amigo de Paulo, que trata de azedar (ou tentar) o sorriso e o tom tão visceral do outro. Ator que já foi dirigido por muitas grifes, Nachtergaele cobre de elogios a dedicação de Patrícia ao ofício de diretora, tomando como exemplo o dia em que ele tentou descolorir os cabelos em um longo processo de tinturas. E pede licença da nossa videocoletiva, após duas horas de conversa, para levar sua “matilha” de cachorros para passear.

Cada episódio é cantado por uma grande cantora brasileira, fazendo jus à celebração que Domingos dedicava ao sexo feminino, começando por Marisa Monte. Foi ela quem sugeriu abrir todos os episódios com uma gravação de “Carinhoso”, clássico de Pixinguinha. Mas é bom que o espectador esteja preparado para o momento de cisão também cantado por ela.

Cássia Eller, Elis Regina, Alcione, Nara Leão e Rita Lee estarão em outros episódios, com um elenco que inclui a própria Maria Ribeiro, uma das idealizadoras da série, Marta Nowill, Felipe Camargo, Fernanda Torres, Maeve Jinkings, Lilia Cabral, Floriano Peixoto, Samya Pascotto,  e Maria Mariana, filha do dramaturgo, entre outros nomes.

Nesta quinta-feira, tem episódio de estreia na Globo aberta, após o BBB 20, e na sexta (24), os 12 episódios da obra estarão à disposição do assinante do Globoplay.

Para Furtado, para quem o “mundo andou para trás” e as visões de Domingos são surpreendentemente atuais, não houve muito o que adaptar em termos de conteúdo, dos originais para a tela da série. Ele admite, no entanto, que já não pode fazer hoje na Globo algumas coisas que fazia nos anos 90, inclusive por questões regidas pelo tom politicamente correto, ao qual, em geral, é favorável.

Prevalece, para Furtado, a aposta de que as festas e abraços expostos na série vão contemplar nossa saudade por cenas similares na vida real, o que esta escriba endossa. Tomara. Vendo Paulo e Maria Alice, vem à tona a vontade de amar como se não houvesse amanhã.

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Cristina Padiglione

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