Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Sem rótulos, Eva Wilma nos conduziu do riso às lágrimas e vice-versa

Eva Wilma morreu em consequência de um câncer de ovário disseminado. Foto: Divulgação/Globo

Eva Wilma era atriz de amplos espectros. Não atriz de comédia. Não atriz de drama. Simplesmente (e por isso muito complexamente) atriz. Um câncer de ovário disseminado encerrou sua trajetória na noite deste sábado (15), aos 87 anos, reforçando minha teoria de que as divas morrem aos sábados, confundindo as rotativas para a edição especial do jornal impresso de domingo.

Artista que desde muito cedo ensinou autores e diretores de que tudo era possível no seu campo de interpretação, fez rir, fez chorar, despertou compaixão e até causou repulsa, quando foi necessário. Construiu uma carreira livre de rótulos, algo contra o qual alguns artistas lutam a vida toda, em vão.

Foi Ruth e Raquel em 1973, quando foram criadas as gêmeas de Ivani Ribeiro que depois tão bem serviram a Glória Pires em “Mulheres de Areia”. Da mesma Ivani, foi ainda a primeira intérprete de outra personagem que renderia remake, a Dinah, de “A Viagem”, em 1975, depois refeita por Christiane Torloni.

Fez o país gargalhar, mas torcer contra ela, como Maria Altiva Pedreira de Mendonça e Alburqueque, mesclando inglês com acento baiano, criação de Aguinaldo Silva em “A Indomada” (1997). O mesmo autor a batizou de Hilda Pontes (mais conhecida como “Hilda, Minha Filha”, como era chamada pelo marido, vivido por Lima Duarte) em “Pedra Sobre Pedra” (1992), onde nos causava afeto e piedade.

Em 1998, foi Doutora Marta, a ciosa médica do seriado “Mulher”, ao lado de Patrícia Pillar, onde contracenava também com o marido, Carlos Zara. Dois anos antes, esteve na linha de frente de uma das mais belas produções de novelas, a primeira fase de “O Rei do Gado”, de Benedito Ruy Barbosa, como Maria Berdinazzi.

Foi Márcia Pereira em “Elas Por Elas” (1982), por Cassiano Gabus Mendes, e Maura Garcez em “Roda de Fogo”, agora disponível no GloboPlay, de Marcílio Moraes e Lauro César Muniz, como uma mulher que foi submetida a tortura na ditadura militar e reencontrava o seu algoz. E foi Angelina Jesus Batista, a primeira protagonista de Alcides Nogueira, em “De Quina pra Lua” (1985).

No início da pandemia, pudemos revê-la na pele da trambiqueira Maria Íris de “Fina Estampa” (2011), também de Aguinaldo Silva.

O último trabalho foi em “O Tempo não Para” (2018-19), de Mario Teixeira, como Drª Petra, e o penúltimo, em 2015, foi Fábia de “Verdades Secretas”, uma senhora que implorava por um beijo na boca e se ressentia pelo fato de ninguém mais querer seu corpo, cena que está entre as melhores de Walcyr Carrasco.

Mas Eva também estaria em uma segunda temporada da ótima série “Os Experientes”, projeto que a Globo afundou, sabe-se lá por quais razões. A primeira temporada foi coproduzida com a produtora O2, de Fernando Meirelles, e rendeu o último trabalho de Beatriz Segall na TV, um episódio primoroso. A segunda safra já tinha cenas gravadas, quando foi engavetada, sob o pretexto de que a série seria resgatada com capítulos feitos só pela Globo, sob outros códigos, o que nunca aconteceu. Pena.

Vivinha, como era tratada por amigos e por aqueles que tentavam demonstrar intimidade, foi casada com John Herbert (1929-2011) entre 1955 e 1976, com quem protagonizou o seriado “Alô Doçura”, (1953-63) e pai de seus dois filhos: Vivien Riefle Buckup e John Herbert Riefle Buckup. Deixa cinco netos: Miguel e Mateus, filhos de Vivien, e Gabriela, Francisco e Vitorio, herdeiros de John Herbert Junior.

Em 1976, casou-se com Carlos Zara (1930-2002), que foi seu par em “Mulheres de Areia” e morreu ao seu lado.

De 1955, no início de carreira teatral, com a peça “Uma Mulher e Três Palhaços”, até 2020, com homenagem pelo conjunto da obra no teatro, Eva Wilma colecionou dezenas de troféus, passando por Roquette Pinto, Troféu Imprensa, Prêmio APCA, Shell, Molière, Gramado, Mario Lago e Cesgranrio, entre outros, pelos trabalhos na TV, no cinema e nos palcos.

A despeito do apelido no diminutivo, dona Eva foi sobretudo figura gigantesca na galeria de personas da nossa dramaturgia, tendo dado os primeiros passos na ponta dos pés, como bailarina, ofício que exercia já aos 14 anos. Logo entraria para o TBC (Teatro Brasileiro de Comédia) e para as telas.

Nossos aplausos à atriz e às dezenas de mulheres por ela representadas.

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Cristina Padiglione

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