Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Ex-amiga de Collor, Cláudia Raia ri de seu passado na novela das sete

Cláudia Raia e Isabelle Drummond em 'Verão 90', no momento em que a personagem admite ter votado em Collor / Reprodução

Uma das amigas mais famosas do casal Rosane e Fernando Collor de Mello naquele finzinho de anos 80 e início dos 90, quando o casal chegou à presidência da República, Cláudia Raia protagonizou uma cena na atual novela das sete que, para quem viveu aqueles dias, foi uma boa piada.

Cláudia Raia e Fernando Collor, em cena real da época

No capítulo de “Verão 90” desta terça, Lidiane, personagem da atriz, admite à filha, Manuzita (Isabelle Drummond) que votou em Collor porque ele “é um pão” (bonito, para o glossário da época). A frase veio em um episódio todo dedicado a lembrar o anúncio do Plano Collor, quando o então presidente e sua ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Mello, avisaram à população que quem tivesse mais que 50 mil cruzados novos (moeda então rebatizada como “cruzeiros”) guardados no banco não poderia sacar além deste limite pelos 18 meses seguintes.

“Nunca gostei tanto de não ter onde cair morta! Eu ia ficar uma arara se pegasse as minhas economias! E olha que eu votei nesse presidente, hein?”, disse Lidiane. A filha completa: “Eu lembro! Votou porque achava ele bonito, gatinho!”.

Na época, até se falou que Cláudia teria um envolvimento com Collor e Rosane.

Hábil na administração de sua imagem, Cláudia Raia sabe enaltecer o melhor de seu passado e fazer com que o público se esqueça das partes nem tão nobres assim. O apoio de Collor faz parte da memória menos exaltada pela atriz, assim como seu casamento com o atual deputado Alexandre Frota, que virou ator pornô.

Em tempo: o capítulo desta terça de “Verão 90” fez um flashback dos noticiários da época, com imagens reais de Fátima Bernardes e William Bonner, ainda em bancadas distintas, falando sobre o plano que tirou o sono de muita gente.

Fátima Bernardes fala sobre o plano: tela dividida mostrava desespero das pessoas nas portas de bancos

Houve ainda imagens de Lillian Witte Fibe, comentarista econômica da emissora na época, e da própria Zélia Cardoso de Mello, em rápida clipagem de cenas de noticiários. Se fosse documentário, e não novela, poderíamos dizer que a edição perdeu o melhor daquele episódio, no contexto Globo: Witte Fibe entrevistou Zélia e fez as perguntas que todos os brasileiros gostariam de fazer na ocasião, a fim de esclarecer o fundamento do plano econômico e seus mecanismos, para o momento econômico do país, para o bolso do consumidor e para um futuro em curto prazo, como prometia a ação do governo Collor.

A ministra não soube responder com precisão às questões e Fibe mostrou impaciência com as evasivas da entrevistada. Nos meses seguintes, a jornalista seria escanteada pelo Jornalismo da Globo, à época comandado por Alberico de Souza Cruz, que atendia à simpatia da família Marinho pelo novo governo. O SBT então contratou Fibe no fim do ano e fez dela uma apresentadora de telejornal, função que a levou de volta para a Globo dois anos depois, em 1993.

Lillian Witte Fibe, que depois sabatinaria uma ministra evasiva nas respostas, tenta explicar o plano

Como grande gerador de conflitos que foi, o Plano Collor é um prato cheio para enredos de ficção e foi usado ainda outro dia por uma das novas séries nacionais da FOX, “Impuros”, que também remonta aos anos 1990. A novela ainda mostra outra situação que beneficiou alguns poucos conhecidos do Planalto na ocasião: as pessoas que foram informadas antes do confisco econômico e agiram em tempo de transformar seus investimentos no banco em dólares guardados longe do alcance das instituições financeiras.

Sorte de “Verão 90” contar com uma vida real tão propícia a bons enredos. A novela é muito ruim no acabamento e no enredo ficcional. Os cenários parecem feitos de tapume. A trilha incidental é risível, primária mesmo, assim como as situações criadas são genuínas no pior sentido da construção dramatúrgica. É como se fosse um “Chaves”, mas sem a despretensão que faz do seriado o sucesso que ele é.

O capítulo desta terça contou com várias passagens que endossam a má qualidade desfilada em cena. Um exemplo foi quando o personagem de Jesuíta Barbosa ouve escondido uma conversa entre a mãe (Dira Paes) e a dona da pensão, Bel Kutner, e chega bem no momento em que ela diz que não confia em banco -prefere ter seu dinheiro ao alcance de seus olhos. Ele então se retira rapidamente do local, corre até o quarto dela, busca logo uma mala sobre o guarda-roupa e abre uma bolsa cheia de dólares. Um desenho animado não faria algo tão patético.

Enredo é feito de construções primárias, como mala de dólares encontrada sobre o armário, no dia em que o governo anunciou que confiscaria o dinheiro dos brasileiros

Como disse o Tony Góes, parece novela de outro canal, nada que se aproxime do tal padrão de qualidade há anos ostentado pela Globo.

Curta nossa página no Facebook e siga-nos no Twitter

Cristina Padiglione

Cristina Padiglione