Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Comédia dramática, ‘Feras’ traduz novas formas de se relacionar

Jesuíta Barbosa e João Vitor Silva: o primeiro beijo entre meninos

Segunda série nacional da MTV Brasil em sua etapa como canal pago, “Feras” envereda pelo tom da comédia dramática, estilo muito presente nas produções internacionais, mas ainda pouco explorado aqui. Na dobradinha de episódios desta segunda-feira, a partir das 22h, tem Jesuíta Barbosa, em participação especial que há de despertar em Ciro (João Vitor Silva), o protagonista, a sensação de que todo mundo pode ser bissexual.

Ciro passou os últimos anos casado, fiel à ideia de monogamia, e perdeu a revolução tecnológica que afetou para sempre o universo das paqueras e flertes. Da separação, iniciativa da mulher, no primeiro episódio, para cá, as descobertas vêm a galope, como se ele tivesse passado a última década em Marte. Na cena do dia, Ciro dará então seu primeiro beijo em um homem, seu amigo de infância, Guile (Jesuíta).

“Feras” lida com o desprendimento sexual adotado por muitos pares que se conhecem ou simplesmente se encontram por meio de aplicativos como Tinder. Lida também com a descoberta de que ninguém é de ninguém, que o toque físico pode afetar independentemente do gênero, que relações entre mais de duas pessoas são possíveis, e lida, sobretudo, com uma mulher assumindo comportamentos nada aceitáveis até bem pouco tempo atrás (que bom!).

Com exibição em dose dupla, a MTV leva ao ar na próxima segunda os dois últimos episódios, mas há as infalíveis maratonas aos finais de semana, para quem perdeu o bonde, assim como a chance de ver sob demanda, na MTV Play, ou no NOW, plataforma para quem assina NET e Claro TV.

Processo de criação

No princípio de tudo, Téo Poppovic, que assina a criação da série ao lado de Felipe Sant’Angelo e também faz a direção-geral, conta que a ideia era trabalhar de fato com essa transformação de valores e comportamentos incentivada, em boa parte, pelo universo da tecnologia. Mas, do momento em que a série foi desenvolvida, a partir de uma verba conquistada por incentivos vindos do Fundo Setorial do Audiovisual, até sair do papel, um movimento importante mexeu muito com o rumo do assunto abordado.

“De 2015, quando surgiu, até a segunda metade de 2017, quando começamos a escrever, teve um movimento maluco, intenso, maravilhoso, transformador, da primavera feminista, do empoderamento feminino e também sobre questões de gênero”, disse Poppovic ao TelePadi.

“A gente percebeu que estava falando de uma série numa perspectiva bem masculina, num momento em que a gente tinha que falar dessa transformação no universo feminino. Então, até mais do que as relações pela  tecnologia, devíamos ver como os comportamentos estavam sendo colocados em cheque, afetando o afeto, como os homens queriam se transformar, analisar relacionamentos, e a gente colocou os personagens nesse conflito. Junto com isso, trouxemos as mulheres para frente, com comportamentos que antes eram dos homens, e trouxemos ‘Feras’ para os dois gêneros. A MTV abraçou esse mesmo movimento”, completa.

“Feras” acabou atendendo a um recorte que a MTV queria abordar, sobre como a tecnologia estava afetando as relações afetivas.

“A série”, explica Poppovic, “tem esses dois movimentos, é uma ‘Black Mirror’ dos afetos, e traz temas como se apaixonar, transar, num tempo em que muita coisa se transforma.”

Outro ponto de partida foi a vontade de enveredar pela comédia dramática, e convém reparar que o elenco, que conta anda com Camila Mardila,  Mohana Uchôa, Rodrigo García, Tulio Starling e Vinicius Beu, não prioriza comediantes.

A produção, da Primo Filmes, também permitiu um prazo folgado para a realização de ensaios, coisa rara na indústria da TV. Poppovic conta que isso deu também aos roteiristas a oportunidade de reescrever muita coisa no vaivém do set de filmagens.

Ponto central do enredo, as mensagens por aplicativos ganharam um protagonismo de tela cheia, em forma inédita.

É sempre louvável ver produtos se multiplicando na TV de formas e conteúdos distintos da baciada produzida pela nossa teledramaturgia, que pelo menos durante cinco das seis décadas de TV no Brasil, foi muito referendada pelo padrão Globo.

“As pessoas estão menos apegadas a rótulos, a gente está propondo esse debate de um jeito que não é taxativo, não é velho.”

Poppovic se diz bem satisfeito com o resultado final e a ousadia embutida no produto.

“A MTV foi muito aberta a essas propostas todas, e acho que temos daí um frescor, uma série dinâmica, com um olhar feminino que vem das diretoras também, a Lia Kulakauskas e Maria Farkas. Mesmo com todo o apego que eu tenho pela série, acho que conseguimos sintetizar muita coisa, e uma sensação de que eu gosto é que você flana pela vida das pessoas, fica com vontade de ver mais, a gente trouxe uma leveza que me deixou muito feliz.”

Embora tenha um fio condutor pelos 13 episódios, é possível compreender cada um de modo independente.

“Feras”: Segundas, 22h, na MTV. Os episódios entram na plataforma sob demanda do canal, MTV Play, após a exibição na TV.

 

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Cristina Padiglione

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