Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Fim da ‘Escolinha’ na Globo não pode ser debitado na conta de Marcius Melhem

Marcius Melhem como Seu Boneco, personagem que ficou sem vaga na última temporada / Divulgação

A saída de Marcius Melhem da Globo por acusações de assédio moral e sexual, o que ele nega, causou um processo de desmanche no humor da emissora, mas nem tudo pode ser colocado na sua conta. O fato é que encerraram todos os seus projetos, mesmo os bem-sucedidos, como era o caso do “Zorra” e do “Isso a Globo Não Mostra”, no Fantástico.

Mas é preciso lembrar que, diferentemente do que algumas publicações vêm afirmando, a “Escolinha do Professor Raimundo”, encerrada neste domingo, após seis temporadas, não nasceu sob o comando de Melhem. Nem na Globo nasceu.

A “Escolinha” foi uma aposta do canal Viva, lá em 2015, e é certamente a mais bem-sucedida parceria entre um canal pago do grupo e a TV Globo, abrindo caminho para outras coproduções. Mas não é de hoje que o fim do humorístico vem sendo protelado. E se o professor Raimundo de Bruno Mazzeo sai de cena neste momento, há que se considerar que sai por cima, antes de desgastes, já tendo rendido até mais do que se esperava quando o projeto vingou.

Em sua conta no Instagram, Mazzeo agradeceu a Letícia Muhana, ex-diretora-geral do Viva, e a Ricardo Waddington, que selou então a parceria em 2015, pela chance de homenagear o pai, Chico Anysio, e todo aquele elenco de veteranos que faziam os alunos do mestre, a parti de uma ideia de Clarisse Goulart, à época diretora do Viva.

“Hoje chega ao fim esse trabalho que tanto me orgulha, que me deu a oportunidade de homenagear meu amado pai e os tantos monstros da comédia que passaram por aquela sala de aula. Minha gratidão @cacagoulart_ (à epoca diretora do @canalviva) que foi quem teve a ideia e primeiro me fez o convite; e a @lmuhana e @ricardowaddington que fizeram com que ganhasse vida. Meu agradecimento e respeito a cada um dos colegas autores e atores que emprestaram seus talentos e toparam embarcar nessa viagem. E em especial a diretora @cininha_de_paula – sem ela seria impossível que tudo isso acontecesse. E meu muito obrigado ao público, que desde sempre entendeu nosso objetivo de homenagear os mestres. Como eu sempre disse, não fizemos um programa de humor, mas um programa de amor.
Viva Chico Anysio e todos os comediantes brasileiros que pavimentaram o caminho pra que hoje a gente possa passear por ele. E viva os professores do Brasil. #Escolinha”

Melhem entrou na “Escolinha” a princípio apenas como ator, para reviver Seu Boneco, personagem que fora de Lug de Paula, irmão de Mazzeo e filho de Anysio. Só passou a ter qualquer ingerência sobre o programa em 2018, tendo ainda revisado o texto da safra que acaba de sair do ar.

Nesta temporada, gravada após a sua saída da Globo, Melhem não esteve presente na classe e Seu Boneco perdeu a vaga na matrícula do ano. Diferentemente do Seu Ptolomeu, antes vivido por Otaviano Costa, que também deixou a Globo, o personagem de Melhem não ganhou novo intérprete. Outra alternativa para Ptolomeu seria Bruno Garcia, que já havia vivido o aluno mais inteligente do professor Raimundo, mas ele estava então envolvido com as gravações dos episódios especiais da série “Sob Pressão”.

Marcelo Serrado foi daí escalado para o papel.

Várias decisões no humor da Globo têm sido atribuídas ao contexto da saída de Melhem, mas convém separar joio de trigo. O “Fora de Hora”, por exemplo, programa lançado em 2020 e interrompido pelo fechamento dos estúdios, em março, por causa da Covid, não se mostrou um projeto acertado desde o início e dificilmente teria conserto.

O projeto original do “Fora de Hora” exigiria um custo maior e até uma boa parte ao vivo, o que foi adaptado a um orçamento menor, com tudo gravado. Além disso, Dani Calabresa, agora se sabe, que apresentaria a atração, preferiu declinar da função ao não encontrar no programa a concepção que ela gostaria de reviver em uma espécie de “Furo MTV”, que ela fazia na velha MTV com Bento Ribeiro.

Renata Gaspar foi chamada para apagar o incêndio, ao lado de Paulo Vieira, que já estava escalado para fazer par com Calabresa. Quando chegou ao ar, e isso foi dito na ocasião aqui neste blog, a percepção de prejuízo do “Fora de Hora” em relação ao “Tá no Ar”, projeto que o antecedeu, era gritante. Fizeram um programa inferior ao que existia. Conhecendo agora os detalhes que antecederam o humorístico, é possível entender que muito do que vimos no seu primeiro episódio foi feito às pressas.

Já “Escolinha”, revivida em várias ocasiões ao longo da trajetória de Chico Anysio, com genéricos que pipocaram em outros canais (teve “Escolinha do Golias”, no SBT, do Gugu, na Record, do “Barulho”, também na Record, e até Sidney Magal foi professor, vejam só, na Band) tem tudo para ser retomada em qualquer época. De tempos em tempos, convém deixar que o formato gere alguma saudade no público, mas esse é um humor que não perece.

A missão da Globo agora é recriar tudo das cinzas, aproveitando parte dos bons roteiristas e atores que lá restaram dos projetos enterrados. A sorte da emissora é que a concorrência é muito fraca e vai muito mal no campo do riso. Atualmente, só existe o humor de “A Praça é Nossa” e do “Encrenca”, na RedeTV!

Para sanar a ausência absoluta do riso na atual temporada, a Globo se socorreu com uma safra do “Vai que Cola”, feito no Multishow, mas, sabemos nós, muito distante do humor político que abastecia até a “Escolinha” e bem mais identificados com uma fórmula que repete mais do mesmo.

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Cristina Padiglione

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