Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Globo demora 12 horas para ‘perceber’ que ‘Vampiro Neoliberalista’ da Sapucaí era Temer

Vampiro Neoliberalista representou Michel Temer, mas, na transmissão, Alex Escobar só conseguiu afirmar que ele tinha "a faixa presidencial"

Na era das redes sociais, nada passa despercebido. Muita gente que assistiu ao desfile da escola de samba Paraíso do Tuiuti  na Sapucaí manifestou via Twitter e Facebook que faltaram comentários e até legendas mais precisas, por parte dos narradores e apresentadores responsáveis pela transmissão na Globo, sobre as informações trazidas pela escola. Quem era, afinal, o “vampiro neoliberalista” que ostentava a faixa presidencial?

Quem? Ninguém na tela da Globo mencionou seu nome durante a transmissão. Ainda no “Bom Dia Brasil”, nada de identificá-lo. Só lá pelas 13h15, durante o “Jornal Hoje”, mais de dez horas depois do desfile, o jornalismo da Globo, sempre tão ávido pela informação em primeira mão, associou o vampiro da Paraíso ao presidente Michel Temer. O delay em relação às rede sociais e a outros noticiários foi gritante.

Também no “Hoje”, o pato presente no desfile foi finalmente associado à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. Eis aí outra informação que não apareceu nem durante o desfile nem no “Bom Dia Brasil”. O didatismo na Globo não costuma falhar, ao contrário, normalmente é até cansativo. Mesmo assim, supondo que a remissão fosse óbvia, faltou lembrar que o bichinho serviu como ícone da Fiesp nas manifestações pelo impeachment de Dilma Rousseff.

Camiseta da seleção, que virou figurino das manifestações pró-impeachment de Dilma; acima, as mãos manipuladoras

Já as camisetas da seleção, igualmente associadas ao impeachment e apresentadas no desfile lado a lado com as mãos manipuladoras da opinião pública, sequer foram notadas em seu contexto pró-impeachment.

Fátima Bernardes foi a única a mencionar a presença da carteira de trabalho como objeto “de defesa dos direitos trabalhistas”. E isso foi tudo sobre o documento de capa azulzinha reproduzido em tamanho gigante próximo ao “Vampiro Neliberalista”. Menção à reforma trabalhista operada no governo do personagem em questão? Zero.

Carteira de Trabalho e Previdência Social, alvo de reformas no governo Temer

Mas, pior que tudo isso, como bem mencionou Maurício Stycer, crítico do UOL, foi ver que as críticas expostas na avenida passaram batido pelas entrevistas feitas por Alex Escobar e Fátima Bernardes no estúdio, pós-desfile. Conversas nesse contexto sempre caem na mesmice de “quem tem samba no pé” e nas “emoções de cruzar a avenida”, blá-blá-blá. Quando o entrevistado de fato parece ter o que dizer, os entrevistadores não lhe perguntam nada a respeito.

É compreensível que a Globo, sempre no olho do furacão e alvo de discordância dos dois lados do Fla-Flu, tenha receio de questionar os carnavalescos sobre o teor de uma apresentação que critica os rumos tomados pela política nacional, com a bênção dos “manipuladores”.

Mas seria um gol a seu favor se a emissora conseguisse questionar quem são esses manipuladores. Pode ser que o entrevistado lhe aponte o dedo? Pode ser, o risco é grande, como mostram os comentários sobre esse episódio nas redes sociais. Abrir os microfones a quem lhe faz críticas, no entanto, seria só um ato de segurança para confirmar a imagem democrática que a Globo tem perseguido, a ponto de dar espaço até a quem discorda de suas coberturas jornalísticas.

Só como paralelo de crítica política, vale notar que a dose de comentários do staff da Globo durante a transmissão do desfile da Mangueira, cujo alvo era o prefeito Marcelo Crivella, foi claramente maior e mais precisa ao prefeito do Rio. Mesmo considerando que no caso de Crivella sua imagem tenha sido identificada com máscara de sua própria foto, sem alusões indiretas – o que não daria vazão para uma omissão como a do “Vampiro” de Temer – a crítica exposta pela Mangueira mereceu definições mais claras, com menos bolas jogadas para que a torcida interpretasse o texto a seu modo, como aconteceu no caso da Tuiuti.

 

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Cristina Padiglione

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