Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Oscar continua menosprezando profissionais negros e suas obras

Angela Bassett é maior vitória negra para este Oscar, indicada a atriz coadjuvante por 'Pantera Negra - Wakanda Para Sempre' / Divulgação

Por Gautier Lee (*)

Com lugar de destaque entre as mais prestigiosas premiações cinematográficas do mundo, o Oscar continua executando impecavelmente sua missão de menosprezar e negligenciar filmes e artistas negros. Após a campanha liderada pela consultora e especialista em diversidade, April Reign, a #OscarSoWhite (OscarTãoBranco em tradução livre), a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas revisitou suas próprias práticas e condutas e buscou diversificar seu corpo de votação. No entanto, a lista de indicados ao prêmio no ano de 2023 chocou a todos ao ignorar muitos dos maiores filmes e artistas negros de destaque do último ano.

Na categoria de “Melhor Direção”, por exemplo, nenhuma mulher ou pessoa negra foi indicada. Nem Jordan Peele por “Não! Não Olhe!” e nem Gina Prince-Bythewood por “Mulher-Rei” que eram considerados apostas certeiras ao prêmio foram indicados. A maior vitória da comunidade negra foi a indicação de Angela Bassett na categoria de “Melhor Atriz Coadjuvante” por “Pantera Negra: Wakanda Para Sempre”. Apesar disso, não podemos nos basear no sucesso, ainda que estrondoso, de “Pantera Negra” como uma régua para medir a qualidade e o alcance do cinema negro, pois a obra é, na verdade, uma excessão à regra por ser parte de uma narrativa transmídia gigantesca que possui uma distribuição massiva e global. E isso se torna mais evidente quando nota-se que performances como a de Viola Davis em “Mulher-Rei” e a de Danielle Deadwyler em “Till – A Busca por Justiça” não foram nomeadas a “Melhor Atriz” mesmo após meses liderando as disputas a respeito. E a não nomeação de ambas tornou-se ainda mais amarga com a indicação supresa e polêmica de Andrea Riseborough por “To Leslie”.

Mesmo sendo ignorada por outras grandes premiações como o Globo de Ouro e o BAFTA, que geralmente são tidos como indicativos do Oscar, Riseborough garantiu sua indicação ao Oscar de “Melhor Atriz” através de uma campanha nas redes sociais e uma rede de contatos que incluía nomes como Gwyneth Paltrow, Kate Winslet e Cate Blanchett. A responsabilidade, porém, não é da cineasta ou do formato de campanha que ela escolheu fazer e sim do sistema que impõe parâmetros diferentes para pessoas negras, especialmente mulheres negras.

A ideia equivocada de que não há mulheres negras o suficiente dentro da área cinematográfica tem sido destruída pouco a pouco com a ascenção de diretoras como Nia DaCosta, Ava DuVernay e Melina Matsoukas. E ao mesmo tempo, atrizes como keke Palmer, Zendaya e Dominique Fishback tem trazido um frescor às telas e contribuído para o aumento de atrizes negras no cinema estado-unidense atual. Todas essas mulheres citadas não apenas talento, mas também fizeram tudo que a Academia estipula como necessário. Desde exibições particulares para a Academia até turnês internacionais de divulgações, as mulheres negras fizeram tudo que lhes foi requisitado. Mas ainda assim, foram ignoradas e a recompensa, na forma de indicação, veio para a mulher branca que não precisou seguir as mesmas regras, provando que nem talento e verba de marketing combinados conseguem ser mais poderosos do que o pacto narcísico da branquitude.

É desanimador ver que o enorme esforço por trás de campanhas como a #OscarSoWhite é inversamente proporcial à disposição tanto da indústria, como dos profissionais brancos que a compõe, de se comprometerem em realizar mudanças reais e duradouras. Afinal, isso significaria mudar um sistema que os beneficia e os valoriza, tendo sido construído por e para eles mesmos, o que deixa cada vez mais nítido o quanto Hollywood odeia pessoas negras. Mas, pôxa, eles já foram melhores em esconder.

A diretora e roteirista Gautier Lee /

(*) Este artigo foi feito especialmente para o blog por Gautier Lee, uma das fundadoras do Macumba Lab, coletivo de profissionais do audiovisual negro no Rio Grande do Sul. Trabalhou em séries para a Amazon, Netflix, Globoplay e Comedy Central. Recentemente, ganhou o 6º Prêmio Abra na categoria de Excelência em Roteiro. E em 2020, escreveu e dirigiu o curta “Desvirtude” que, em sua estréia no Festival de Cinema de Gramado levou os prêmios de Melhor Montagem, Melhor Atriz, Juri Popular, Melhor Direção e Melhor Filme. Agora em setembro, lançou seu filme “Samba às Avessas”, inspirado no disco de mesmo nome da sambista Pâmela Amaro. Por fim, Gautier também levanta a bandeira em relação à luta de pessoas trans na sociedade.

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Cristina Padiglione

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