Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Renomada produtora de elenco lança ‘O Ator e o Mercado’, um bom guia do ofício

Imagem do livro 'O Ator e o Mercado', click da autora, produtora de elenco, atriz e fotógrafa / Ciça Castello/Divulgação

Uma das produtoras de elenco mais respeitadas do mercado brasileiro de dramaturgia, do palco à telona, passando pela TV e internet, Ciça Castello está lançando um livro que reúne uma série de percepções calçadas em larga experiência sobre o ofício do ator.

“O Ator e o Mercado” está à venda online, pela Hotmart, por R$ 37,90, e reúne, além do relato da autora, 17 depoimentos de gente muito bem-sucedida no ramo, cada um contando suas histórias, seus anseios, seus conflitos e seus desfechos felizes. Ali estão as narrativas de gente como Kiko Mascarenhas, Daniel de Oliveira, Marcelo Laham, Heloísa Perissé, Selton Mello, Ana Kutner, Marcello Bosschar, Vladimir Brichta, Antonio Grassi, Larissa Manoela, Gregório Duvivier, Eliane Giardini, Vânia de Brito, Ingrid Guimarães, Mariana Ximenes, Inez Peixoto e do diretor Breno Silveira, com quem Ciça trabalhou no filme “Dois Filhos de Francisco”.

Dona de um currículo raro, a autora conseguiu produzir um guia bastante útil aos profissionais do ramo, sobretudo aos novatos e àqueles ainda insatisfeitos com o rumo em curso até aqui, mas também a quem já encontrou seu eixo. E como o ator é, de certa forma, a execução prática de todo o contexto que envolve uma obra dramatúrgica, o livro interessa também aos demais profissionais que o cercam, como diretores, autores, editores, produtores e criadores de modo geral, da publicidade a produções infantis, do humor ao drama.

“O livro nasceu da história de eu começar a trocar ideias com os atores pela internet”, contou Ciça ao TelePadi. “Tudo começou de conversar com os atores sobre várias coisas, desde qual é o seu sonho, e disso nasceu um trabalho que eu comecei a fazer lá no início de 2019, quando eu ficava com o ator ou a atriz entendendo o que ele buscava, eu passei a fazer uma consultoria artística, uma assessoria”, lembra.

Ciça Castello / Divulgação

Atriz de formação, esta profissional procura os melhores atores para cada papel e papéis de todos os tamanhos para atores de perfis de todo tipo há pelo menos 25 anos.

No Tablado, conceituada escola de teatro do Rio, conheceu profissionais que são grandes parceiros até hoje, como Selton Mello, Danton Mello, Ana Kutner, Michel Bercovitch e Heloisa Perissé.

Durante algum tempo, manteve um pé no palco e outro nos bastidores, desde sempre empenhada na produção de peças de teatro e logo de cinema, a convite de Paulo Betti. Feita profissional do ramo, percebeu que não dispunha da cara de pau suficiente para entrar em cena como atriz, e foi se encantando por todo o processo que leva alguém a encarar o palco e as câmeras com todo o desprendimento necessário ao exercício que ela tão bem estudou.

“Os atores saem das escolas invariavelmente sem saber muito o que é o real: a gente sai do teórico, do experimento e tudo fica muito maior. Eles tentam seguir um pouco as fórmulas que são dadas pra eles, e isso gera uma certa angústia quando não se consegue alcançar essas fórmulas”, diz Ciça.

“Comecei a atender esses profissionais e vi que as questões e dúvidas se repetiam”, observa, o que reforçou a ideia do livro. Nesse caminho, muita gente pensou em desistir, entrou em depressão e alternou processos de euforia e desânimo.

“Esse mercado, isso que a gente trata como um personagem monstruoso, fica querendo que as pessoas se padronizem e esqueçam as suas essências, enquanto elas precisam pensar quem são, o que são, por que querem chegar ali, por que ser ator e atriz.”

Ciça usa a própria trajetória como script do livro, exemplo de uma carreira construída e moldada ao longo da grande transformação sofrida por esse métier nos últimos 20 anos. Atualmente, atende a cerca de 30 atores em sua consultoria, a Artífice, e mais dez profissionais de outros departamentos relacionados ao audiovisual, inclusive roteiristas e produtores de trilhas sonoras.

“Uma das coisas que eu queria dizer é que às vezes a gente começa como ator e não necessariamente fica ator. É um lugar que tem milhões de possibilidades. Sou muito movida pelo meu desejo, não fico em nenhum lugar onde eu não seja feliz. Isso fez com que eu fosse buscando cada vez mais. O livro tem essa tentativa de estimular as pessoas a serem o que elas quiserem ser.”

Ciça trabalhou como produtora de elenco na Globo entre 1999 e 2003, voltou em 2012 e depois voltou a sair da emissora. Trabalhou com Luiz Fernando Carvalho, Guel Arraes, José Luiz Villamarim, Maurício Farias, Ricardo Waddington, Daniel Filho e outras grifes, tendo emprestado seus créditos a produções como “O Rebu”, O Canto da Sereia”, “Amores Roubados”, “Mulher”, “Amorteamo” e “A Grande Família”.

Entre os musicais, esteve em “Tim Maia”, com direção de João Fonseca, e “Gaiola da Loucas” e “Hairspray”, ambas dirigidas por Miguel Falabella.

No cinema, Çiça narra no livro sua busca pelo precioso elenco de “Dois Filhos de Francisco”, tendo trabalhado ainda em “Se Eu Fosse Você”, “Meu Nome não é Johnny”,  “O Palhaço” e “Amor?”, entre outros.

Tanto a trajetória dela como os depoimentos expostos no livro inspiram os profissionais do ramo a encontrar o empreendedor que há por trás do artista, dadas as chances que hoje se abrem para quem quer mostrar seu talento. “Há outras profissões em que é possível produzir a própria trajetória. Por que o ator precisa ser contratado de alguém para a sua carreira funcionar? Médicos, advogados, engenheiros e todas as outras profissões sabem se criar. Por que os atores não se produzem? Todas as pessoas que tiveram essa postura na vida, como produtores, se transformaram em grandes profissionais. É possível estar disponível para o mercado, sem ser refém desse mercado”, ensina.

Ciente de que vivemos um período de transformações muito aceleradas, Ciça menciona no livro que “tivemos, entre 2000 e 2016, um período precioso de políticas públicas para o fomento da cultura e da arte, que ampliou o acesso à formação e circulação pelo país”. “Esse investimento foi importante para a valorização da diversidade da arte brasileira. Cada região do Brasil é um tesouro de referências culturais e históricas. Isso trouxe visibilidade para a potência criativa do Brasil. Os recursos foram distribuídos e várias experiências ganharam visibilidade nacional. Era como se o ‘Brasil passasse a conhecer melhor o Brasil’, através do grande fluxo de festivais de teatro, cinema, música e dança. Produções nacionais encantando e lotando plateias, num intercâmbio de arte pelas regiões.”

“Atualmente”, no entanto, “estamos vivendo um desmonte, mas a consciência da importância de entender o potencial das nossas origens, da nossa história de vida, ficou”, pontua a autora, otimista.

Por fim, vale reproduzir uma breve lista de dicas que encerram o livro de Ciça, e nem vou lembrar aqui alguns preceitos básicos ao bom exercício do ator, como entrar em cena sempre com texto decorado, ter disciplina na pontualidade e fazer a lição de casa, ou seja, estudar personagem e texto.

Para além desse básico, Ciça lembra alguns pontos que constroem grandes profissionais do ramo:

  • O ator nunca para de estudar. (Não estou falando de fazer um curso atrás do outro. E sim de uma formação diária).
  • Ator tem que ler.
  • Ator tem que assistir muito a cinema, a muita série, a muita TV.
  • Ator tem que ver teatro.
  • Ator tem que ler teatro.
  • Ator tem que observar.
  • Ator tem que ser curioso.
  • Ator tem que ampliar suas habilidades.
  • Ator tem que ter referênciaPor fim, questiono se ainda há muita gente que confunde a vocação para ser ator com o desejo de ser famoso. Ela me garante que isso já foi um problema maior no passado. Talvez hoje muitos candidatos à fama, na melhor definição de I wanna be famous, dividam seus anseios com a trajetória meteórica de youtubers. Além disso, a comoção que havia por um galã de novela das nove até o início dos anos 2000 se arrefeceu consideravelmente.
    Como referência, Ciça se lembra de circular por lugares públicos com Leonardo Vieira no início de “Renascer” (1993), quando o ator não podia dar um passo em qualquer saguão de aeroporto. “Isso não existe mais na proporção que já existiu”, constata.

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Cristina Padiglione

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