Por Cristina Padiglione | Saiba mais
Cristina Padiglione, ou Padi, é paga para ver TV desde 1990, da Folha da Tarde ao Estadão, passando por Jornal da Tarde e Folha de S.Paulo

Tributo a Chacrinha resgata até o padrão das chacretes e vale ser visto, mas faltou a Rita Cadilac

Fábio Jr. grava o especial Chacrinha 100 anos par o Viva e a Globo

Telespectadora que fui do Velho Guerreiro, fiquei comovida com o musical protagonizado por Stepan Nercessian e agora, mais ainda com o tributo prestado a Chacrinha pelo canal Viva e pela Globo, em performance especialmente produzida para a TV e levada ao ar por ocasião do centenário de seu nascimento.

Vale a pena ver? Vale muito. Quem viu o original vai se emocionar. E as gerações que não tiveram a chance de vê-lo em cena darão de cara com um programa que traduz muito do legado daquela figura, mas que também evidencia a perda de alguns valores importantes presentes nos shows televisivos de Abelardo Barbosa. O maior prejuízo que tivemos de lá para cá é a gourmetização dos auditórios. Repare como há uma lacuna entre o palco e a plateia nos auditórios atuais. Artistas dispostos a receber o toque físico do público mal conseguem se aproximar dos anônimos que gritam seu nome. Salvo raras exceções, há um hiato entre o palco e a plateia.

Só agora, vendo o tributo a Chacrinha, eu me dei conta de que aquele contato entre ídolo e fãs histéricas desapareceu. A própria histeria foi pasteurizada. No lugar de cartazes com os nomes dos astros, o público hoje sustenta seu aparelho celular, pronto para um filminho e para selfies. Normalmente controlada por animadores profissionais e claques, a plateia de hoje também já procura se comportar de modo a não se jogar sobre o artista, como faziam naquele tempo, imagem preservada nesse especial de Chacrinha. Atualmente, mesmo um programa como Altas Horas, que não estabelece muros entre artistas e público, tem sempre um grupo de espectadores tão civilizado, que todo mundo pode fingir que sempre esteve ao lado dos mais aclamados artistas ali presentes.

No tributo produzido para o Viva e para a Globo, as moçoilas se jogam sobre Fábio Jr. e Sidney Magal. Surgem com bloquinhos e capas de discos nas mãos, pedindo um autógrafo. Ostentam cartazes e capas de LP de quem está se apresentando, tudo com muita disposição de serem notadas e sem acanhamento em parecerem, afinal, histéricas.

O próprio Stepan nos lembra desse contraste, logo no início da edição, quando propõe a Roberto Carlos o “primeiro selfie do Chacrinha”, apontando seu celular para uma foto com o Rei.

Os figurinos dos jurados são um capítulo à parte: brilham muito, exatamente como pede a ocasião. O glitter se repete nas roupas dos convidados, com ênfase para Sidney Magal, metido numa camisa de estampa de onça ao som de Sandra Rosa Madalena, Anitta, Ney Matogrosso e Alcione, trabalhados no paetê, e Luiz Caldas, que parecia saído de um replay antigo, tamanha a semelhança com as cenas originais. Nos smokings dos jurados, mais brilho. Fernanda Lima e Angélica fazem jus ao mau gosto da época, com muito brilho e, no caso da senhora Huck, um vestido longo dourado ofuscante que mais parecia um penhoar de luxo.

Leifert busca a linha do jurado mal-humorado, que tem em Pedro de Lara seu ícone mais conhecido na vida real. “Respeitem a minha opinião!”, pede ao auditório, que responde com vaias. Glória Maria, cada vez mais jovem, investe nas cores e modelão tropical.

Roberto Carlos e Fábio Jr. têm direito a um flashback exibido no telão ao alto do cenário, enquanto estão no palco. “Olha, eu tinha até cabelos ondulados! É que naquele tempo ainda não existia a progressiva”, diz Roberto, único convidado para quem o júri se mantém em pé, durante toda a apresentação.

Fábio Jr. se joga para a plateia, coloca-se à disposição do toque físico das fãs, que o recebem aos gritos de “Lindo! Tesão! Bonito e gostosão!”, “Vocês não sabem como é bom ouvir isso depois de 35 anos”, admite o cantor.

A certa altura, Marcius Melhem, Otaviano Costa, Welder Rodrigues, Tom Cavalcante e Marcelo Adnet entram para participar de um concurso de calouros em que a prova é imitar justamente o Chacrinha. São todos menosprezados pelos jurados, o que torna a sequência divertida. Troféu Abacaxi neles.

Ivete Sangalo encerra a homenagem, implorando a Stepan que realize seu desejo:  “queria que você perguntasse à plateia se eles querem o bacalhau da Ivete Sangalo”. Um bolo de parabéns se anuncia e os ilustres jurados ocupam o palco para o desfecho.

Nos intervalos, Fausto Silva, Pedro Bial e Serginho Groisman tentam explicar por que Chacrinha foi revolucionário.

A edição conta ainda com a Blitz, e Evandro Mesquita tira do baú os óculos escuros que ostentava nos anos 80, além de Luan Santana e Marília Mendonça, dois artistas que não têm idade para ter frequentado o Cassino original do Chacrinha, mas que lá estariam, se o programa existisse hoje.

O projeto de levar Chacrinha à TV na pele do mesmo Stepan que impressionou o público no musical escrito por Pedro Bial nasceu há mais de dois anos, quando o Viva celebrou seu quinto aniversário com uma plateia de convidados para uma sessão do musical no Teatro Alfa, situação que tive o prazer de testemunhar. Na ocasião, tivemos a sorte de ver na plateia duas das figuras mais emblemáticas do universo de Chacrinha: Rita Cadilac, a mais famosa das chacretes, e Elke Maravilha, a mais famosa de suas juradas. Dada a maestria de Stepan no papel de Velho Guerreiro, ver Elke e Rita naquele teatro foi quase uma experiência mediúnica.

Daí a dúvida atroz sobre a ausência de Rita nesse tributo: por que ela não estava lá?

Na ausência de Elke, que morreu no ano passado, Angélica assumiu a alcunha de “Painho” no tratamento com o Velho Guerreiro. Mas, se não temos mais Elke nem Russo, o memorável contrarregra do Chacrinha, por que não encontrar um posto para a presença de Rita Cadilac?

Falando em Rita, as chacretes prezam pelas medidas das chacretes originais: nada de meninas marombadas, exibindo tanquinho no abdômen ou perfis muito enxutos. Chacrete que é chacrete tem boas medidas e zela pelas curvas, o que pede quadril, nádegas e coxas. Os maiôs, é verdade, são menos cavados que os originais, mas as botas de cano alto, acima do joelho, de salto alto, na cor prata, honram a image da Discoteca ou do Cassino do Chacrinha original.

 

Com uma hora e meia de duração, Chacrinha está disponível no Viva Play até o dia 31. A partir do dia 2, entra no catálogo da Globo Play. A TV Globo exibirá o tributo ainda em setembro, na noite do dia 6, em espaço deixado vago pelo futebol do Brasileirão em razão do feriado do dia seguinte.

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